Bnei Anussim contam

Bnei Anussim contam

No âmbito das atividades do Centro Ma’ani, com a ajuda do conselho de Shaar Binyamin e o nosso querido amigo Federico Pipman, representante de Mama Mía 360, esta semana tivemos o painel de Histórias Pessoais “Bnei Anussim contam” e tivemos como convidados especiais Rav Eliahu Franco, de El Salvador, e Eliav Riera, de Cuba.

As histórias foram muito emocionantes e inspiradoras para o público e, sem dúvida, vieram para demonstrar a transcendência do povo judeu ao longo da história. Os nossos convidados partilharam a sua experiência de retorno ao judaísmo e o caminho árduo que percorreram, bem como todas as bênçãos e milagres que viram no seu caminho e que continuam a ver nas suas vidas construídas agora na terra de Israel.

Pode ouvir as histórias como foram contadas ao vivo no vídeo que compartilhamos abaixo:

PRIMEIRA PARTE:

SEGUNDA PARTE:

No âmbito do evento também convidámos o Rav Natan Menashe que nos cativou com uma aula especial intitulada “Descovery”, onde expôs a descoberta dos segredos encontrados no Tanach e as surpreendentes revelações da Meguilá Esther. No livro de Ester estão os presságios dos eventos que mais tarde aconteceriam ao povo judeu e a notável atuação da rainha Ester que, como muitos dos Bnei Anussim, mais tarde teve que esconder o seu judaísmo e a sua origem para salvar a sua vida e a de todo o povo judeu.

Também tivemos a honra de conhecer duas importantes personalidades que “por acaso” nos vieram visitar: Israel Gantz, prefeito de Shaar Binyamin, e o autor e escritor do livro Pninei Halacha, Rav Eliezer Melamed, que partilhou connosco uma linda mensagem sobre Tisha B’ Av.

O evento foi catalogado por muitos como um encontro enriquecedor e necessário onde cada pessoa presente pôde conhecer um pouco mais sobre o judaísmo e sobre as histórias pessoais dos convidados que, de forma especial, ajudam a fortalecer e animar o povo judaico e as pessoas em processo de conversão ao judaísmo. Veja todas as fotos do evento CLICANDO AQUI.

 

Parashat Noach

O dilúvio – Retirado do livro Ideas de Bereshit, dos rabinos Isaac Sakkal e Natan Menashe

Perguntas:

  • Porque decide De’s destruir toda a geração do dilúvio?
  • Porquê desta maneira, com um dilúvio?
  • De’s é perfeito e não tem mudanças. Ele sabe tudo antes de que aconteça. Na nossa parashá, vemos que, depois do dilúvio, De’s diz que nunca mais vai destruir toda a humanidade. Isto quer dizer que De’s se arrependeu ou que mudou a sua maneira de pensar depois do dilúvio?
  • Porque será o arco-íris o sinal de que a humanidade nunca mais será destruída?
  • O que é o pacto com os filhos de Noé?

Respostas

Os motivos da destruição de toda aquela geração são: Araiot (relações incestuosas) e Chamas (roubo).

Para esta afirmação, baseamo-nos no versículo de Génesis 6:2, que diz: VaIru bnei Elokim et benot adam ki tovot hena, vaIkechu lahem nashim mikol asher bacharu. – E viram os homens mais importantes (mais sábios) as mulheres, que eram bonitas, e tomaram para si mulheres, das que mais lhes apeteciam. Entende-se do versículo que eles as tomaram pela força, apesar de elas serem casadas. Quem comete adultério, além do seu ato desonesto, está a roubar, já que essa mulher é de outro ‏homem; era do seu próximo e ele tira-lha. Para além disso, eram cometidos outros tipos de maldades e violência, tal como diz o versículo: Era grande a maldade do Homem sobre a terra.

O motivo pelo qual De’s decide destruí-los com um dilúvio é que De’s está a fazer tudo voltar para trás, quer dizer, está a desfazer o que fez, está a fazer com que tudo regresse ao Tohu vaBohu, quando apenas existia água e escuridão. E precisamente o versículo que nos cita aí é: VeRuach Elokim merachefet al pnei haMaim – A Presença Divina estava sobre a água, tal como agora com o dilúvio, em que é tudo água.

De’s não muda a forma de julgar. Ele não tem mudanças. Por isso é errado supor que De’s se arrependeu. Então quando diz que não vai haver outro dilúvio, é porque De’s já conhece tudo e sabe que não haverá outra geração tão perversa como a do dilúvio. O dilúvio em si (onde toda a geração foi apagada devido à sua maldade) e o surgimento de Abraão, que vai transmitir ao ser humano valores elevados, é o que vai impedir que toda a humanidade caia novamente num nível tão baixo.

Devemos saber que o arco-íris está formado por dois princípios básicos para a vida: A água e a luz.

Portanto, o arco-íris sempre existiu, já que é um fenómeno físico, produto da divisão dos raios de luz através da água; não é algo novo que De’s criou naquele momento.

Então porque escolhe esse sinal? Para recordar aos homens que o mundo não existe gratuitamente e para sempre, independentemente do que façamos. Faz falta um Zechut Kium –  um mérito mínimo para existir.

Se não há luz – neste caso, um pouco de espiritualidade, captação das verdades abstratas (metafísica), conceção de De’s e temor a Ele, então essa água, que nos recorda que existiu um dilúvio no qual a humanidade foi destruída, pode voltar a acontecer. 

O midrash relata-nos que, na época de Rabi Shimon bar Iochai e na geração do rei Hizkiahu, não se viu o sinal do arco-íris. Este midrash não nos vem relatar a realidade meteorológica daquelas épocas, mas sim referir-nos que, naquelas gerações de tão alto conteúdo de sabedoria, esse sinal não fazia falta. Insisto: Isto não quer necessariamente dizer que não houve arco-íris, já que se trata de um fenómeno natural, mas sim que aquela mensagem, para aquelas gerações, não fazia falta. Eles já o sabiam muito bem. Não necessitavam ver o arco-íris para terem estes princípios presentes e agirem em conformidade.

O pacto que De’s estabelece com a humanidade é que os homens se comprometem a reproduzir-se e a não assassinar, quer dizer, a construir e não a destruir, já que essa foi a vontade de De’s quando criou o mundo.

Parashat Bereshit

Ki tov – Viu que era bom – Retirado do livro Ideas de Bereshit, dos rabinos Isaac Sakkal e Natan Menashe

O primeiro que notamos é que o Bem é algo básico; é por isso que aparece desde o começo da Torá.

Rambam, no Guia dos Perplexos, terceira parte, capítulo 10, defende que tov quer dizer que existe, que é estável. O existir é algo bom. O contrário é o Mal, aquilo que destrói. Portanto, toda a existência material depende de De’s, e é Ele que faz com que tudo seja, portanto, é algo bom. Isto implica que nós, a quem foi ordenado andar nos Seus caminhos, também devemos fazer com que o mundo permaneça, que seja estável. Por outras palavras, devemos fazer o Bem.

No que diz respeito ao segundo dia, onde não diz: «E Viu De’s que era bom», isto é assim porque ainda não se tinha visto o benefício claro desta divisão das águas. Só no terceiro dia, quando aparece a terra que vai ser o prelúdio da vida vegetal, é que se vê o benefício, e então diz: «E Viu De’s que era bom».

Rashi acrescenta que, para que algo seja bom, deve ser completo. Se estiver pela metade não é bom. É por isso que esta frase vai ser dita somente no terceiro dia, que é quando fica concluída a tarefa com as águas.

O midrash diz-nos que o verdadeiro Bem é o homem justo. Quer dizer, o mundo por si mesmo não é algo bom nem mau, mas sim apenas um meio ao dispor do ser humano: se for bem utilizado, então, será bom.

É por isso que, quando homem foi criado, não foi dito «E Viu que era bom – ki tov –», pois é o ser humano que tem o livre arbítrio para fazer o Bem ou o Mal, portanto, ainda não se pode dizer se vai ser bom ou mau.

Esta é a causa pela qual é consagrado o dia de Shabat, que é quando acaba a criação física, e este é abençoado exatamente para nos demonstrar que o mundo material não é o principal e essencial mas sim só um meio, e que o mundo espiritual é o verdadeiro Bem, que é precisamente o que o Shabat nos traz.

No que diz respeito ao Mal, uma primeira resposta é que o Mal, ao princípio, não existia; ele aparece depois de o Homem comer da árvore da qual lhe tinha sido proibido comer; só quando Adão desobedece é que aparece o Mal. Se não tivesse desobedecido, não teria havido Mal. Tudo teria sido Bem. É o Homem quem faz o Mal.

Os sábios no midrash são mais ousados e defendem que quando diz tov meod – «muito bom» –, refere-se à morte. Assim diz Rabi Meir, pois a morte dá repouso aos justos e serve de advertência aos malvados. Que quer dizer «dá repouso aos justos»? Quer dizer que, durante toda a vida, o justo luta sem parar contra o mau impulso, contra as tentações e os desejos. Quando chega a morte, pode finalmente descansar de todo esse assédio e ameaça constante e pode desfrutar eternamente da presença divina. No que diz respeito aos malvados, é como uma advertência para não fazerem o mal, pois chegará o dia da sua morte e vão ter que prestar contas de tudo o que fizeram.

Rambam diz que todas as coisas naturais que nos parecem más, na realidade são acontecimentos naturais que são bons para a manutenção do mundo. A morte é uma consequência da matéria, pois somos feitos de matéria e a matéria destrói-se, e isso mantém o ciclo da vida. A morte dá lugar à nova geração. Assim se mantém o sistema, as gerações sucedem-se, e assim o mundo funciona.

Mesmo as limitações, sejam económicas ou outras, também são positivas, pois ajudam-nos a mantermo-nos no objetivo e a não nos desviarmos. Quando uma pessoa possui demasiado, o mais provável é que se desvie da meta para ir em busca do seu próprio prazer, pois dispõe dos meios para se poder permitir ter tempo livre para passear etc. Mergulha no mundo do prazer e esquece-se do verdadeiro objetivo.

Outro midrash diz: Tov refere-se ao mundo vindouro (recompensa) e tov meod refere-se ao Gueinom (castigo). O que isto significa é que é bom que exista a justiça, que o homem que se comporta corretamente merece ser recompensado e que aquele que não, levará um castigo. Quer dizer, a Torá não pensa como o cristianismo, que diz que não se deve castigar o culpado, mas sim que deve haver justiça e deve receber aquilo que justamente merecer.

Vejamos por exemplo, o sono. Poderíamos pensar que o sono é algo mau: faz-nos perder um terço do nosso dia, e, por conseguinte, um terço da nossa vida. No entanto, é bom, porque demonstra ao Homem que ele é limitado, que não pode tudo, que não tem um poder absoluto; não lhe é possível estar mais de dois dias sem dormir. Não pode ter tudo sob controlo o tempo todo.

O fantástico disto é que todas as coisas que consideraríamos más, os sábios consideram boas.

No que diz respeito ao mau instinto, como entra isto num mundo de Bem?

Diz Rabi Shimon que se não fosse pelo mau impulso, o Homem não construiria casas, não casaria, não procriaria, nem trabalharia. Quer dizer que o mau impulso pode ser usado para bem e pode retirar-se dele algo construtivo. Se não fosse pelas paixões físicas, então os animais e os seres humanos não se reproduziriam. Quer dizer: graças a isso é que o mundo se constrói e renova. Isto é sempre quando seja usado para o bem, senão seria muito destrutivo.

Por conseguinte, o mau instinto não é algo mau por si só. É o Homem que o pode utilizar para bem ou para mal. De’s não criou o mau instinto; De’s criou o instinto e o impulso, mas é o homem que o pode utilizar para fazer coisas corretas ou incorretas.

O Mal vem por causa da ausência de sabedoria, por causa da ignorância. Tal como o cego, que não pode ver e por isso tropeça e magoa-se, assim é aquela pessoa que não tem sabedoria. É como um cego que anda pela vida e tropeça e magoa-se ou magoa outros. É por isso que, nos dias messiânicos, quando toda a terra estiver cheia do conhecimento de De’s e de sabedoria, então as guerras já não existirão mais. A ausência do conhecimento – é o homem que não o quis adquirir – é que causa o Mal, não foi De’s quem criou o Mal. Tal como uma pessoa que compra um móvel para montar: O produto vem com instruções, mas a pessoa decide montá-lo sem as ler e o móvel fica mal montado. A culpa não é do fabricante, mas sim do cliente que não quis ler as instruções e agir de acordo com as mesmas.

De’s cria um mundo bom, estável e que se mantém. Tudo no seu conjunto é bom. Talvez se analisarmos um aspeto isolado do todo pode parecer-nos que é mau, mas quando o vemos a interagir no conjunto da Criação, vemos que é bom. Tal como uma peça preta de um quebra-cabeças com uma imagem de umas ilhas iluminadas pelo sol: Se olharmos para essa peça preta isoladamente, podemos pensar que é um erro, mas ao vê-la no seu lugar exato, vemos que se trata da sombra de uma palmeira, e ela então encaixa perfeitamente. O ser humano tem a capacidade e o dever de utilizar tudo isto para o Bem.

Parashat Haazinu

O objetivo do cântico de Haazinu – Retirado do livro Ideas de Devarim, dos rabinos Isaac Sakkal e Natan Menashe

O objetivo deste cântico que De’s ordena a Moisés escrever é advertir o povo acerca do mal que lhe acontecerá no caso de se assimilar à cultura idólatra dos povos de Canaã, até ao ponto em que chegará a esquecer-se de De’s, que foi Quem formou o povo de Israel.

De’s adverte-os de que, no caso de O abandonarem, então Ele retirará deles a Sua providência divina, o que fará com que fiquem expostos às catástrofes naturais e às maldades dos demais povos.

No entanto, há uma esperança e um consolo: o povo, finalmente, entenderá que só a De’s deve servir. De’s impedirá que todo o povo de Israel seja aniquilado, para que o Seu Santo Nome não seja profanado. Vingar-se-á dos inimigos de Israel e expiará os pecados do Seu povo.

Contrariamente aos historiadores e a muitos dos líderes laicos do povo de Israel, que defendem que o povo de Israel se conduz do mesmo modo que os outros povos e que lhe ocorrem as mesmas coisas que a qualquer povo, a Torá sublinha de forma clara que não é assim.

O povo de Israel é o único povo que foi formado pelo próprio De’s, tal como diz o versículo: Ele é teu pai, teu fazedor e formador.

É o único povo a quem De’s dirige e instrui através de mandamentos justos, tanto para o indivíduo como para a sociedade em geral. Não são só leis para manter o equilíbrio e a paz social, mas sim também pautas e normas de comportamento para vida privada de cada indivíduo, que o ajudam a elevar-se e a evitar tornar-se depravado indo atrás dos prazeres e apetites materiais. Também os afasta de falsas ideias e cultos nocivos. Como diz: Encontrando-se no deserto numa terra desolada, trouxe-o ao redor (do monte Sinai) e instruiu-o.

É o único povo que é conduzido por De’s, seja em forma geral ou em forma particular, pois conta com a providência divina. É o que diz o versículo: Cuida-o como à menina dos Seus olhos. Tal como a águia que desperta a sua ninhada, voa sobre os seus filhotes, estende as suas asas, toma-os e leva-os sobre as suas asas.

Ele é o Senhor e dono do mundo, e é Ele que nos entregou a terra de Israel, e que nos expulsará dela por causa das nossas transgressões. Quando fez herdar a cada povo o seu território… E decretou as fronteiras das nações…

Destes pontos podemos deduzir que o povo de Israel não é igual aos demais povos:

  • Não foi o povo que se formou a si próprio nem surgiu de motu próprio; foi De’s que o constituiu.
  • Não é o povo que compõe as suas próprias leis e mandamentos de acordo com o seu próprio parecer, é De’s que lhes fornece um sistema de leis elevado, justo e equilibrado.
  • O povo não é dono da terra; toda ela pertence a De’s, e Ele entrega-a quem Ele considera justo.
  • Não é o povo que forja o seu destino; é De’s quem o salva e redime dos seus inimigos ou desgraças.

O objetivo destes versículos é De’s testemunhar de antemão tudo o que vai acontecer se abandonarem De’s, e adverti-los que não pensem que as desgraças que lhes acontecem são coisas naturais, tal como acontece com os demais povos. Estes versículos são um convite à reflexão, à observação da História e ao recordar dos tempos passados. De onde vêm? Quem os formou? E quem os guiou? Observar tudo o que De’s fez por eles e a maneira tão mal-agradecida na qual se comportaram com Ele.

Então verão que De’s é quem os conduz e quem vela pelo seu bem, e dessa maneira retornarão a Ele e o servirão. Então De’s voltará a eles, os salvará e lhes fornecerá a Sua proteção e manutenção com abundância, paz e harmonia.

Parashat Vaielech

Mitzvat Hakehel – Reunir todo o povo de Israel – Retirado do livro Ideas de Devarim, dos rabinos Isaac Sakkal e Natan Menashe

Texto a analisar: Devarim 31:9-13

O primeiro que notamos é que quando diz esta Torá, não se refere a toda a Torá, pois a Torá ainda não estava acabada; faltavam acontecimentos que ainda não tinham sido escritos. É por isso que, mais à frente, 31:24-26 diz: E foi quando acabou de escrever as palavras desta Torá no livro, até que o completou (…) Tomai este livro da Torá e colocai-o o na arca do pacto do Eterno. Nesse versículo vê-se claramente que somente aí se completou a escrita da Torá. Portanto, o nosso versículo da parashá de Hakehel (E escreveu Moisés esta Torá), não se refere a toda a Torá.

O livro Devarim pode dividir-se da seguinte maneira: as três primeiras parashiot (Devarim, Vaetchanan e Ekev) tratam dos temas fundamentais do judaísmo, os que têm a ver com a fé em De’s e com as boas qualidades.

Depois, as próximas três (Ree, Shoftim e Ki Tetzé) são parashiot de mitzvot específicas.

A três seguintes (Ki Tavó, Netzavim e Vaielech) fazem finca-pé na importância de nos mantermos firmes e fiéis ao pacto.

As duas últimas (Haazinu e VeZot Habrachá) são as últimas palavras de Moisés, ditas em forma poética.

A expressão esta Torá já foi mencionada antes, na parashá Ki Tavó, e, tal como dissemos, essa parashá faz parte das parashiot que se referem a nos mantermos fiéis à Torá. Portanto, a nossa parashá não faz alusão aos cinco livros da Torá, mas sim àquelas partes da Torá que sublinham o facto de sermos fiéis ao Pacto.

E era precisamente isto que o rei tinha que ler. As partes do livro de Devarim que falam da importância de cumprir a Torá e manter o Pacto.

Por outras palavras: deve escrever todos os parágrafos que advertem sobre os benefícios e consequências do cumprimento dos preceitos (sem entrar nos detalhes dos preceitos), quer dizer, as bênçãos e as maldições e todos os parágrafos que nos incitam ao cumprimento de toda a Torá.

O motivo pelo qual é entregue aos cohanim e aos sábios, é porque os cohanim eram quem ensinava a Torá ao povo, e por isso era importante que tivessem estes parágrafos à mão para poder ensiná-los a toda a gente.

E é a isto que faz alusão quando diz que se devia ler a cada sete anos, pois a Torá deve sempre ser lida e estudada, e não só os cohanim e os sábios, mas sim todo o povo.

Portanto, vê-se claramente que a intenção deste preceito não é estudá-la e aprendê-la, mas sim renovar o Pacto entre o povo e De’s, lendo-a a cada sete anos.

O povo fez um Pacto com De’s no monte Sinai, e depois renovou-o aos quarenta anos em Arvot Moav. Se prestarmos atenção, veremos que nessas duas ocasiões são utilizadas as mesmas palavras mencionadas agora.

A cada sete anos, quando a ideia do Pacto consertado com De’s se vai esquecendo na consciência do povo, Moisés diz-lhes que é necessário renová-lo. É por isso que isto foi dito logo depois de Moisés ter reunido o povo inteiro para renovar o Pacto.

O que Moisés fez foi juntar todo o povo e renovar o Pacto, e agora diz-lhes que isso deve ser feito cada sete anos. É por isso que têm que vir todos: homens, mulheres e crianças, tal como aconteceu no monte Sinai.

É precisamente isto o que diz Rambam em Hilchot Chaguigá 3:1-3: É um preceito reunir todo Israel, homens, mulheres e crianças, ao finalizar o ano sabático, quando sobem ao santuário. Devem ler-se aos seus ouvidos parashiot que incentivem ao cumprimento dos preceitos e que os fortaleçam na religião verdadeira. Parashiot cujo objetivo é o cumprimento geral das mitzvot.

Quando se reunia e se lia tudo isso? No final do sétimo ano sabático, depois do primeiro dia da festa de Sucot, lia-se a Torá. E era o rei quem devia lê-la no pátio do Templo. O que é que o rei lia? Lia desde o princípio do livro de Devarim até à primeira parte do Shemá; depois saltava até à segunda parte do Shemá e depois saltava até às bênçãos e às maldições. (Acaba aqui a citação de Rambam em Hilchot Chaguigá).

O motivo pelo qual se lia exatamente estes parágrafos é porque neles vê-se claramente o incentivo para cumprir todos os preceitos.

Tal como quando um indivíduo quer juntar-se ao povo de Israel, o que se faz é explicar-lhe os princípios básicos do judaísmo, a existência de De’s, a Sua unicidade, que opera a justiça, etc. E sobre estes temas diz Rambam que nos devemos estender e abundar em detalhes, e depois ensinam-se de forma breve o resto dos preceitos. Com isto, é suficiente para entrar no Pacto.

É isto mesmo que se deve fazer a cada sete anos.

Porquê os sábios estipularam que era precisamente o rei quem devia ler esta Torá diante de todo o povo no fim dos sete anos? De onde aprenderam isto, se a Torá não disse nada ao respeito?

Se observarmos o parágrafo anterior ao nosso, ele fala-nos justamente de que Yehoshua seria quem faria entrar o povo de Israel na terra. E ele era precisamente o líder político do povo, aquele que exercia o cargo de rei.

É por isso que aprenderam que o rei é que devia ler tudo isto aos ouvidos do povo e renovar o Pacto com De’s. E porque o rei é o líder deles, é ele que tem a autoridade para comprometer e obrigar a todos a cumprir o Pacto, já que todo o povo o teme e obedece às suas palavras. Este é o motivo pelo qual deve ser lido pelo rei. Para além disso, desta maneira o Pacto ganha uma conotação muito mais solene e séria.

Porquê deve ser feito a cada sete anos? Porquê no ano sabático? Justamente depois do ano sabático, quando estão tranquilos, não estão atarefados com os trabalhos do campo e as dívidas foram perdoadas, então é quando têm a mente tranquila para poder pensar em tudo isto.

Mais um ponto a ter em conta é que precisamente agora as pessoas começavam novamente a se dedicar aos seus trabalhos. Por isso, antes de iniciarem os seus afazeres de rotina, a Torá ordena este ritual, para que o povo tenha o Pacto bem presente nas suas mentes. Tal como o fizeram no deserto com Moisés, onde reafirmaram o Pacto antes de entrar na terra, para não terem medo de tudo o que iam ter que enfrentar, assim também, a cada sete anos, repetem isto, para terem força e poderem enfrentar tudo aquilo com que se terão que deparar nos próximos anos de trabalho, e para a sua confiança e fé em De’s não se debilitarem.

Liam-se estes parágrafos no fim do ano sabático, antes de começar tudo novamente; desta maneira vão aprender que não devem temer nada, que o único caminho e a única fórmula para triunfar é fazer a vontade de De’s.

No momento em que vai começar a vida diária e a rotina, é quando é necessária uma dose extra de fé e temor a De’s para não tropeçar.

É por isso que se fazia em Sucot, pois nesta festa consciencializamo-nos de que tudo depende de De’s e não só de nós. Em Sucot recordamos que fomos atrás de De’s por caminhos inóspitos e Ele nos conduziu pelo deserto e fez com que nada nos faltasse.

Está escrito: Reunirás o povo, homens, mulheres, crianças e os estrangeiros que estejam nas tuas cidades, para que escutem e para que aprendam e temam o Eterno vosso De’s e cumpram todas as palavras desta Torá.

Porquê está escrito para que escutem e para que aprendam? Deveria ter dito para que escutem e aprendam.

O comentarista Or HaChaim diz que o motivo pelo qual se repete a palavra para duas vezes é porque se dirige tanto ao homem como à mulher. A maneira em que a mulher capta algo é geralmente diferente da maneira do homem: A mulher vivencia-o, recorda-o, e fá-lo. O homem, pelo contrário, é mais analítico: estuda-o, e aí é que se convence e se compromete.

O objetivo a que se deve chegar é temer a De’s, e isso vai levar-nos a cumprir todas as palavras desta Torá e cumprir os seus preceitos. É por isso que se repete duas vezes a palavra para, pois refere-se à internalização, seja da maneira feita pela mulher ou pelo homem. (Por experiência ou analiticamente).

Então, qual é o objetivo: Temer a De’s ou cumprir a Torá? Na realidade, os dois são o objetivo. Que o cumprimento dos preceitos seja com temor a De’s, com um profundo respeito reverencial. Que não seja um ato reflexo e automático, sem pensar no que faz ou onde isso o conduzirá.

O facto de ser o rei quem lhes lê tudo isto ajuda a gerar temor no povo.

O motivo pelo qual as crianças pequenas também devem estar presentes, apesar de ainda não entenderem, é para adquirirem temor a De’s. Não é para aprenderem os preceitos, pois, como dissemos, ainda não têm raciocínio; o objetivo é que, ao ver todo o povo e o rei a ler a palavra de De’s, eles adquiram uma tal experiência que fique gravada na sua memória e nunca seja esquecida.

Estas palavras voltam a repetir-se outra vez na Torá, e é precisamente no sopé do Monte Sinai. Ali diz: Cuida-te muito de não esqueceres o que viste com os teus olhos, e que não se afaste do teu coração todos os dias da tua vida. E ensinarás aos teus filhos e aos filhos dos teus filhos, o dia em que estiveste perante De’s no monte Chorev quando De’s disse: – Reúne-Me o povo e faz-lhe ouvir as Minhas palavras, que lhe ensinarão a temer-Me todos os dias que vivam sobre a terra e os seus filhos o aprenderão.

Não se trata só de recordar e renovar o Pacto. É algo que vai mais além; trata-se de reviver o Pacto. Não é algo meramente intelectual, mas também um acontecimento emocional; vivenciar o Pacto com De’s como se fôssemos nós que estamos de pé no monte Sinai aceitando os mandamentos de De’s.

Este é o motivo pelo qual não se fazia todos os anos em Sucot, pois seria algo muito rotineiro. Mas ao fazê-lo a cada sete anos, passa a ser algo mais especial. Como, por exemplo, quando se faz Bircat Hachamá (a bênção quando começa um novo ciclo solar), que ocorre uma vez a cada muitos anos. Apesar de ser somente uma bênção rabínica, é realizada do mesmo modo, com muita emoção e entusiasmo, porque é algo que ocorre a cada muitos anos.

Uma vez a cada sete anos a Torá fazia-nos reviver todo este evento para que, com alta emoção e no meio de todo o povo, o Pacto e o temor reverencial a De’s ficassem gravados no mais profundo do nosso ser.

É por isso que se fazia no santuário, pois o tabernáculo (como já explicámos) era como se fosse um monte Sinai portátil.

Rambam, em Hilchot Chaguigá 3:4 diz: Antes de o rei ler no sétimo ano, tocavam-se as trombetas em toda Jerusalém para reunir todo o povo e construia-se uma grande plataforma no santuário e o rei lia dali para que todos o escutassem e todo o povo se reunia ao redor dessa plataforma.

De aqui vemos que as trombetas fazem-nos recordar o som do Shofar no monte Sinai. As pessoas ao redor da plataforma recordam-nos todo o povo a rodear o monte Sinai para escutar a voz do Eterno.

Continua Rambam dizendo: Cada um deve ver-se a si mesmo como se estivesse a receber nesse momento a Torá e está a ouvi-la da boca de De’s.

O número sete é muito recorrente em todo este parágrafo, pois tem em total sete versículos, 140 palavras (20 × 7); sete vezes aparece o nome de De’s; deve ler-se no sétimo dia da festa de Sucot; essa festa cai no sétimo mês, e fazia-se a cada sete anos.

Tudo isto nos faz recordar quando saíram do Egito, e que ao fim de sete semanas (7 × 7) estiveram no sopé do Monte Sinai para fazer o Pacto com De’s.

O acontecimento do monte Sinai não foi chamado «Dia do Sinai» ou algo do género, mas sim precisamente: Yom HaKahal, e este preceito da nossa parashá chama-se precisamente a mitzvá Hakehel.

O dia em que todo o povo (Kahal) esteve frente a De’s, com temor reverencial, para se transformar no povo de De’s.