O legado português no cemitério judaico de Hamburgo

O legado português no cemitério judaico de Hamburgo

Por: Paulo Pisco

Veja aqui o artigo original completo do jornal português Diário de Notícias

O cemitério judaico-português de Hamburgo é um exemplo extraordinário da presença portuguesa no mundo, onde a história confirma a conhecida capacidade de adaptação dos portugueses aos contextos e situações mais inesperados.

Construído em 1611, e onde foram registadas mais de 1500 sepulturas, segundo algumas fontes, o cemitério foi oficialmente encerrado há quase um século e meio e é hoje um lugar de visita intenso e o mais antigo da cidade e do norte da Europa. Passa-se o portão que o protege e o visitante é logo envolvido pelas árvores altas e dispersas que dão sombra e frescura às lápides com inscrições em português, outras em hebraico, muitas com um véu de fuligem e musgo, umas tombadas outras na vertical.

Fugidos de Portugal por causa da Inquisição no final do século XVI, os cristãos novos foram bem aceites em Hamburgo, onde encontraram um lugar para viver, sem terem de esconder a sua religião e rituais judaicos. Situado então numa das zonas mais nobres da cidade, o nome da rua, Königstrasse, Rua dos Reis, é disso mesmo um reflexo.

O terreno foi adquirido pelos comerciantes portugueses André Falero, Ruy Cardoso e Álvaro Dinis, que conquistaram as graças do soberano e assim conseguiram que “a nação portuguesa pudesse sepultar os seus defuntos”, os judeus sefarditas, segundo o pequeno livro Arquivos de Pedra – 400 anos do Cemitério Judaico de Königstrasse. Com a sua ação, deixaram para a posteridade um extraordinário legado, onde se encontra uma parte da História de Portugal e de Hamburgo, o que certamente terá contribuído para que esta cidade seja hoje a mais portuguesa da Alemanha, com inúmeras marcas da nossa presença, do “bairro português” apinhado de restaurantes, ao antigo navio-escola Sagres ancorado no porto, da omnipresença dos pastéis de nata, ao único busto do Vasco da Gama existente no estrangeiro.

Amsterdã – Parte 1

Por que os judeus denominaram a cidade de Amsterdã “o lugar”, “o país” ou “a nova Jerusalém”?

A comunidade de Amsterdã é uma das comunidades mais importantes e famosas da história judaica e que deixou sua marca em todo o mundo judaico a partir do século XVII. Amsterdã era, sem dúvida alguma, a cidade da sabedoria e da Torá, num único lugar. Durante os trezentos anos de existência da comunidade, nasceram e aí chegaram, vários personagens religiosos e intelectuais, que deixaram sua marca na cidade e no judaísmo. No século XVIII, a comunidade de Amsterdã era considerada a mais importante comunidade da Europa, tanto a nível espiritual como a nível geral. Na cidade haviam várias empresas judaicas,  que tratavam de propagar a Torá de seus sábios em toda Europa e em todo o mundo judaico.

Entre os sábios da comunidade e os famosos personagens, é imprescindível mencionar a Menashe Ben Israel, descendente de anussim, de alto nível intelectual, que fez com que o Rei da Inglaterra abrisse as portas para os judeus, além deste, o “Chacham Tsivi”, o Rabino Ariel Leib de Kalish, Rabi Moshe Rivkish autor do livro “Beer Hagolá”, vindo da Polônia. Também grandes sábios como o “Ramchal” e o “Chidá” passaram pela cidade e ensinaram alí durante diferentes épocas. Supostamente, ap058_1_04-640x428s figuras que foram tão criticadas em Amsterdã e no mundo judaico, Uriel da Costa, homem de fé e filósofo que foi excomungado junto com seu amigo Baruch Espinosa, conhecido como um dos filósofos judeus mais importantes do mundo.

Os judeus acostumaram chamar a Amsterdã, ao longo das gerações de “makom” (lugar) ou “mokom” lugar em idish. Outros a denominaram “Ierushalaim Ocidental” ou “a pequena Ierushalaim” ou ainda “a nova Ierushalaim”. Outros corajosamente a chamaram “o país”. Todos estes termos foram outorgados por judeus que chegaram a Amsterdã e encontraram alí uma forma de vida que favoreceu-lhes, contrariamente aos lugares de onde provinham onde eram perseguidos constantemente. Parte desses títulos seguem sendo utilizados até hoje, também por cidadãos não judeus para descrever o caráter da cidade.

O início da comunidade judaica de Amsterdã aconteceu com uma tragédia para os judeus e finalizou após uma outra tragédia também por eles vivida. A comunidade nasceu após a Expulsão da Espanha e findou seu radiante caminho após 350 anos com a Shoá (Holocausto) dos judeus na Europa. A comunidade dos judeus de Amsterdã surgiu das cinzas das fogueiras da Inquisição, no século XVI, pelos judeus que dela escaparam e finalmente sucumbiu nas cinzas dos crematórios dos campos de concentração, quando a maior parte de seus membros foi assassinada no Holocausto. Entre estes dois trágicos acontecimentos floresceu uma comunidade que logrou ter centenas de anos dourados. De fato, a maior parte da história judaica na Holanda acorreu entre o fim do século XVI e a Segunda Guerra Mundial.

 

A Origem da Comunidade Judaica de Amsterdã

A comunidade de Amsterdã, não é uma comunidade muito antiga, pois é das comunidades européias que foram constituídas em uma época relativamente posterior as outras kehilot. A presença judaica na Holanda era muito pequena até o século XVI. Haviam somente poucas e isoladas comunidades e algumas famílias dispersas. Os registros mostram que os judeus foram perseguidos e expulsos do país constantemente. A mais difícil perseguição sofrida, ocorreu entre os anos 1349 e 1350, após terem sido, culpados de propagar a peste negra. Durante os dois séculos seguintes, pelo visto, não viveram judeus no país, até que os governantes da Holanda se rebelaram contra a Espanha no fim do século XVI e criaram as Províncias Unidas da Holanda.

A zona que é conhecida hoje em dia como Holanda, era então, parte do Império Espanhol, porém em 1581 as províncias holandesas do norte declararam sua independência. A mais importante causa da declaração foi o desejo de cumprir e respeitar a religião protestante, que era proibida de ser professada baixo o governo espanhol católico, e a tolerância religiosa representava o fator legal mais importante para a nova república independente. A liberdade de culto, chamou a atenção dos judeus, que sofriam da opressão religiosa em grande parte da Europa.

Uma das razões das quais os judeus se fixaram em Amsterdã foi, sem dúvida alguma, a tolerância religiosa da cidade. Em 1597 a República Protestante Holandesa declarou que ninguém seria perseguido por sua crença religiosa. Desta forma os judeus podiam casar-se, não eram obrigados a usar um símbolo especial ou assinar uma declaração de que eram judeus. Praticamente, não havia nenhum outro lugar na Europa onde os judeus tivessem essas direitos básicos. Desta forma, as províncias da Holanda que gozavam de sua recente liberdade ofereceram uma oportunidade ideal aos judeus anussim de outros países, de voltarem a respeitar e cumprir a sua religião de forma aberta, livre, e assim, eles emigraram especialmente para a capital, Amsterdã.

No fim do século XVI e início do século XVII, começaram a emigrar judeus anussim de Portugal. A maior parte destes judeus, eram aqueles que foram expulsos da Espanha e foram para Portugal no ano de 1942 e continuaram vivendo seu judaísmo em terras lusitanas até que a espada inquisitorial bradou e eles foram convertidos à força coletivamente em 1496. É importante assinalar, que a expulsão da Espanha não recaiu sobre aqueles judeus que se converteram ao catolicismo, tão pouco, aos anussim que se converteram e continuaram respeitando em segredo sua religião, senão aos judeus verdadeiramente dito, que continuaram respeitando o judaísmo de forma completa e aberta. A Inquisição temia que esses judeus leais tornassem-se uma “má influencia” para os que haviam se convertido, e tentassem levá-los de volta ao judaísmo. No entanto, também os judeus anussim lograram sair da Espanha e Portugal em certas ocaciões e oportunidades que lhes surgiam e aos poucos foram chegando à Amsterdã. Holanda, era nessa época, o país livre e de maior tolerância à outras religiões. Os governantes do país estavam muito interesados na chegada de judeus, tanto a nível econômico, como forma de oposição a Igreja Católica e suas doutrinas. A Holanda compreendeu que os judeus tinham a força de desenvolver a economia, graças as relações com seus compatriotas da Europa, América do Sul e Oriente e assim trazer grandes benefícios ao país.

Vários judeus escutaram sobre a “abertura” na Holanda e sobre sua tolerância para com os judeus e decidiram emigrar para lá. Assim chegaram refugiados judeus de Portugal, Espanha, Itália e também Turquia e África do Norte, para dar início, naquele país, a uma vida nova.

A comunidade judaica da Holanda não era uma comunidade típica. Enquanto a maior parte dos judeus da Europa eram discriminados a nível econômico e social, além do político, os judeus holandeses, já no século XVII, gozavam de uma tranquila situação financeira e social, da qual o restante dos judeus europeus não conheceram por centenas de anos. Profissões como a medicina, passaram a ser muito populares e doutores judeus podiam trabalhar livremente, inclusive com pacientes não judeus.

Entre os emigrantes que foram para Amsterdã, estavam aqueles que chegaram por motivos econômicos e outros, pelo visto a maioria, por um verdadeiro desejo de retornar a religião judaica, sem coerção de outras religiões, sem perseguições e humilhações.

E de fato, durante o século XVII, os judeus portugueses, com seus conhecimentos de idiomas e os contatos no comércio internacional, se tornaram importantes na economia e no desenvolvimento naval do país, além de criarem laços comerciais no Brasil e nos países orientais. Os mesmos se acupavam da importação e exportação de diamantes e distintas mercadorias, e foi graças a eles que Amsterdã tornou-se o centro comercial mais exitoso da Europa.

 

Os Judeus Ashkenazitas

Apesar dos primeiros colonos de Amsterdã serem judeus sefaraditas que durante muitos anos tiveram grande influência na comunidade, a partir do século XVII (1630), chegaram a Holanda judeus da Europa Central e Leste que, com o tempo, tornaram-se em maior número e consequentemente mais influentes na comunidade judaica. Emigraram primeiramente, para Alemanha e depois ao Leste europeu, Polônia, Lituânia e Ucrânia. Eles se estabeleceram também em outras cidades da Holanda, em especial em Roterdã e em Haia. As perseguições e as matanças na Polônia e na Lituânia ocasionaram emigrações massivas de judeus destes países para a Holanda. A maior parte dos emigrantes escaparam de perseguições na Europa, especialmente da violenta Guerra dos 30 anos (1618 – 1648) e do massacre de Chamilnitzky na Polônia, em 1648.

Durante os séculos XVII e XVIII, a quantidade de ashkenazim cresceu enormemente e ultrapassou a dos sefaradim; no fim do século XVIII a comunidade sefaradita se estabeleceu em cerca de 3.000 pessoas, enquanto que a comunidade ashkenazita cresceu e chegou a compor cerca de 20.000 membros.

É importante enfatizar que a comunidade ashkenazita de Amsterdã foi pioneira na Europa, pois foi justo aí que foi publicado o primeiro jornal em Idish no mundo (O Cunrat), que começou a circular a partir de 1686, duas vezes por semana, muito antes dos similares publicados na Alemanha e Polônia. E ainda, os judeus ashkenazitas de Amsterdã foram os primeiros a traduzir o Tanach ao Idish.

As relações entre a comunidade Sefaradita e a Ashkenazita, não era nesse mesmo momento símbolo de amor e fraternidade. Os judeus sefaradim viam com desprezo aos judeus ashkenazim, que lhes pareciam mendigos e aculturais, enquanto que os judeus ashkenazim não compreendiam o espírito dos descendentes dos anussim os quais combinavam conceitos judaicos e não judaicos em sua religião. De fato, não havia, naquela época uma única comunidade judaica em Amsterdam, mas duas comunidades separadas e distintas.

 

Continua no próximo número.

A Histórica Sinagoga Portuguesa de Amsterdã

A Histórica Sinagoga Portuguesa de Amsterdã

Colocando o Tefilin no interior da histórica Sinagoga Portuguesa de Amsterdã
Colocando o Tefilin no interior da histórica Sinagoga Portuguesa de Amsterdã

Mês passado estive de visita em Amsterdã na Holanda e tive a oportunidade de conhecer a linda Esnoga (Sinagoga, em ladino), a sinagoga portuguesa construída em 1675, pela comunidade Sefaradita da cidade, comunidade esta que chegou a Holanda principalmente, procurando escapar da Inquisição. Me emocionei ao poder colocar meu Tefilin no local que representava a força e a fé deste povo milenar. Exemplo de uma comunidade que passou por momentos tão difíceis, desde a Inquisição ate o Holocausto, e mesmo assim, nunca esqueceram suas tradições, e não apenas construíram uma casa para D’us neste mundo, como a transformam numa das sinagogas mais bonitas que visitei!

 
De Portugal à Amsterdã

De 1580 a 1640, em Portugal, ainda funcionava os Tribunais da Inquisição. Neste período houve uma imigração maciça de judeus portugueses, assim como de judeus espanhóis, para os Países Baixos. Assim, com a chegada de judeus em Amsterdã foram se formando algumas comunidades, e em 1622 já havia três importantes congregações. A primeira, que surgiu por volta de 1610, Bet Jacob, mais tarde a Newe Shalom, que possuía um caráter mais hispânico, e por fim a comunidade Bet Israel. As três finalmente se uniram em 1639 para dar origem a “Congregação Portuguesa Israelita de Amsterdão”, Talmud Tora, que ainda existe com o mesmo nome.

Em 1670 foi decidido pela congregação que a pequena sinagoga antiga seria demolida para dar lugar a uma nova construção. O planejamento de Elias Bouman que foi o escolhido. Este baseando-se no Templo de Jerusalém e nas construções da elite de Amsterdã da época, propôs construir uma grande sinagoga central cercada de uma construção menor, que daria espaço para quartos e depósitos. E assim foi feito. Acima da porta principal da sinagoga lê-se em letras hebraicas douradas o versículo do salmos: “Mas eu, pela abundancia de Vosso amor, entrarei em Vossa casa.” Além do sentido próprio, estas palavras, por meio de estrelas colocadas acima de certas letras, denotam o ano do calendário judaico em que o letreiro foi colocado (5432 = 1672) e o nome de um dos fundadores, o rabino ou chacham (sábio) Aboab.Mês passado estive de visita em Amsterdã na Holanda e tive a oportunidade de conhecer a linda Esnoga (Sinagoga, em ladino), a sinagoga portuguesa construída em 1675, pela comunidade Sefaradita da cidade, comunidade esta que chegou a Holanda principalmente, procurando escapar da Inquisição. Me emocionei ao poder colocar meu Tefilin no local que representava a força e a fé deste povo milenar. Exemplo de uma comunidade que passou por momentos tão difíceis, desde a Inquisição ate o Holocausto, e mesmo assim, nunca esqueceram suas tradições, e não apenas construíram uma casa para D’us neste mundo, como a transformam numa das sinagogas mais bonitas que visitei!

 
O primeiro rabino das Américas

Rabino Isaac Aboab da Fonseca: O primeira rabino das Américas
Rabino Isaac Aboab da Fonseca: O primeira rabino das Américas

O rabino, cabalista e escritor, Isaac Aboab da Fonseca, natural de Beira Alta, Portugal, era filho de judeus marranos que foram forçados a se converter ao Cristianismo. Quando ele tinha apenas 7 anos a família se mudou a Amsterdã aonde puderam voltar a professar a fé judaica. Em 1623, com apenas 18 anos, Isaac foi apontado rabino da comunidade Bet Israel, e em 1642 foi enviado para ser rabino da comunidade Kahal Zur Israel na colônia holandesa de Recife, Pernambuco, no Brasil. Sendo, dessa forma, considerado por alguns como o primeiro rabino das Américas. Quando os portugueses reconquistaram Pernambuco, o Rabino Aboab voltou a Amsterdã com parte de sua comunidade, outra parte imigrou para a America do Norte e foram parte dos fundadores da cidade de Nova Iorque. Em 1656, foi nomeado rabino chefe da comunidade sefaradi dos Países Baixos e esteve entre os rabinos que excomungaram da comunidade o filosofo Baruch Spinoza. O Rabino Isaac Aboab da Fonseca foi um dos principais fundadores da Esnoga, Sinagoga Portuguesa de Amsterdã e uma das principais figuras da comunidade até seu falecimento em 1693.

 

 

Entrada da Esnoga
Entrada da Esnoga

A Esnoga

A grande Esnoga tem espaço para 1200 homens sentados e 440 mulheres, que sentam na parte superior da sinagoga e foi conservada com a mesma estrutura até hoje. A sinagoga possui algumas curiosidades. Uma das mais interessantes, na minha opinião, é a falta de eletricidade. A Esnoga é iluminada por centenas de velas posicionadas em castiçais espalhados pelo ambiente. Outro detalhe é o Hechal (armário dos rolos da Lei) e a teba (onde o Hazan, cantor que leva as rezas, se posiciona) são feitos de madeira de jacarandá, importada do Brasil por um de seus freqüentadores, Moises Curiel.

 

Os Judeus de Amsterdã

Vista do interior da sinagoga quando iluminada pelas centenas de velas
Vista do interior da sinagoga quando iluminada pelas centenas de velas

Até a ocupação Nazista em 1940, os judeus desfrutavam de uma liberdade de vivencia, culto e expressão muito grande. Formaram-se na comunidade banqueiros, comerciantes, artistas, filósofos, rabinos e eruditos aos montes e estes desempenharam um papel chave no desenvolvimento econômico e cultural dos Países Baixos. Antes da guerra, viviam nos Países Baixos cerca de 140.000 judeus, sendo 4.300 de origem “portuguesa”. Após a guerra, apenas 20.000 judeus haviam sobrevivido, 800, “portugueses”. Hoje se estima que somente 700 façam parte da congregação.

Amsterdã, além de ser uma linda e curiosa cidade, possui uma rica cultura e tradição judaica. Assim recomendo fortemente aqueles que tiverem a oportunidade algum dia, de fazer uma visitinha a esta cidade fenomenal, no caminho para Israel!

Emissário da Shavei Israel participa do 400º aniversário do Cemitério Judeu Holandês

Emissário da Shavei Israel participa do 400º aniversário do Cemitério Judeu Holandês

Rabino Salas no cemitério
Rabino Salas no cemitério

Em 1536 a Inquisição espanhola se expandiu até o território de Portugal, visando os judeus que haviam se convertido ao catolicismo para escapar da perseguição, mas que eram suspeitos de continuar a praticar o judaísmo em segredo. Muitos destes “Anussim” (conhecidos também, como, cripto-judeus, conversos ou “Marranos”) escaparam de Espanha para Portugal, e quando a Inquisição os alcançou, escaparam novamente, desta vez para a Holanda, onde, finalmente, foram bem recebidos e puderam reiniciar suas vidas. A segurança sentida em Amsterdã, particularmente, permitiu que as novas comunidades judaicas praticassem o judaísmo novamente livremente.

Em 1614, o primeiro cemitério judeu foi inaugurado em Amsterdã. O cemitério celebrou o seu 400º aniversário em dezembro do ano passado, e o Rabino Elisha Salas, emissário da Shavei Israel para os Bnei Anussim de Portugal, foi convidado a participar das festividades.

Para o Rabino Salas, que reside em Belmonte, Portugal, e trabalha com os Bnei Anussim portugueses, alguns dos quais, somente agora, estão descobrindo suas raízes judaicas, este evento seviu como uma inspiração para ver como os Anussim de centenas de anos atrás, encontraram a liberdade para poder, enfim, abraçar a sua herança.

“Poderia-se pensar que, devido ao enorme poder da Inquisição, os Anussim que fugiram para Amsterdã continuariam a esconder seus nomes judeus” diz o Rabino. “Mas o que vi no cemitério de Amsterdã e na descrição dos fundadores da sinagoga da comunidade judaica, não eram nomes alemães, mas sim, portugueses!”

As comemorações incluíram orações na Esnoga, Sinagoga Portuguesa de Amsterdã, fundada em 1671 (abaixo o link do artigo que escrevemos sobre a Sinagoga Portuguesa de Amsterdã), uma visita ao Museu Judaico e uma visita à biblioteca Etz Chaim que pertence a família Montezinos.

Antonio de Montezinos era um viajante Português e, marrano, que em 1644 convenceu a Menashé ben Israel, Rabino-Chefe de Amesterdã, que havia encontrado uma das Dez Tribos Perdidas nas selvas do Equador. Isso resultou no livro “A Esperança de Israel”, que se tornou um best-seller em 1655.

O melhor do fim de semana, é claro, foi a visita ao cemitério. O Rabino Salas plantou lá uma oliveira trazida da aldeia de Alentejo, em Portugal. “A oliveira é um símbolo de união entre o passado e o presente, entre Portugal e Holanda”, explica. A oliveira tem um significado especial para o judaísmo. “É desta árvore que extraímos o óleo para acender as velas de Shabat e de Chanuká, que nos iluminam em Belmonte… e no mundo”.

Após a visita, o Coro Sefaradita de Amsterdã homenageou o grupo com músicas que lembram a longa história dos judeus em Portugal e nos Países Baixos. O Rabino Salas ficou profundamente comovido. “Seu belo cantar nos transportou a nossa amada Israel. Com a antiga fé que nos manteve ao longo de todas nossas viagens, por muitos países e durante tanta épocas”, diz.

A história dos Bnei Anussim de Amsterdã, que reivindicaram sua herança depois de serem expulsos de suas casas em Portugal, e que, influenciaram, tão orgulhosamente, o desenvolvimento econômico e intelectual de muitas das terras onde os holandeses se assentaram, é muito inspirador. Quanto mais para os Bnei Anussim de hoje, que, com a ajuda do Rabino Salas, têm tido a oportunidade de fazer história novamente.
Para ler o artigo que escrevemos sobre a Sinagoga Portuguesa de Amsterdã, clique aqui.