Sessenta e cinco anos após a morte do Capitão Arthur Carlos de Barros Basto – fundador da comunidade judaica no Porto, e defensor apaixonado dos Bnei Anussim de Portugal – ainda se debate sua reintegração póstuma ao Exército Português. Barros Basto foi expulso do exército há quase sete décadas atrás pelo “crime” de proclamar com orgulho sua herança judaica!
A recomendação de reintegrar Barros Basto foi feita no fim de julho de 2012 pelo Parlamento Português, depois de quase 10 anos de lobby da Shavei Israel e a neta do capitão, Isabel Maria de Barros Lopes, que no ano passado apresentou um pedido formal ao presidente do parlamento Português. A Shavei Israel, então, lançou uma petição on-line amplamente divulgada para complementar o pedido de Lopes. A petição recebeu mais de 1.300 assinaturas.
O Capitão Barros Basto foi um soldado condecorado que comandava uma companhia de infantaria Portuguesa na I Guerra Mundial. Lutou nas trincheiras de Flandres, e participou da ofensiva aliada para libertar a Bélgica. Em 1937, no entanto, os militares Portugueses sumariamente o expulsaram de suas fileiras, humilhando-o injustamente, pois havia lançado uma campanha pública para despertar os Bnei Anussim de Portugal a regressar às suas raízes judaicas.
Barros Basto foi ele próprio parte dos Bnei Anussim – um descendente de judeus cujos antepassados tinham sido forçados a se converter ao catolicismo durante a época da Inquisição espanhola. Após a guerra, ele abraçou a fé de seus antepassados e foi submetido a um retorno formal ao judaísmo perante um tribunal rabínico no Marrocos espanhol. Vestindo seu uniforme militar e suas medalhas, viajou entre as cidades e aldeias do interior de Portugal, fazendo discursos empolgantes, conduzindo serviços judaicos e procurando inspirar outros a seguir seu exemplo.
Voltando-se aos judeus do mundo por ajuda, ele conseguiu levantar os fundos necessários para a construção da magnífica sinagoga Mekor Haim, que ainda existe na cidade do Porto, e abriu uma yeshiva que operou por nove anos, ensinando jovens Bnei Anussim sobre sua herança. Sozinho, também produziu um jornal judaico, HaLapid (a Tocha, em hebraico), além de ter sido responsável pela publicação de vários livros sobre a história judaica e Direito Português.
Mas sua prática aberta do judaísmo, e as milhares de pessoas que inspirou, não se compatibilizavam com o governo ou as autoridades da Igreja da época. Estes procuraram sufocar seu crescente movimento, trazendo-lhe encargos ligados à prática da religião judaica. O Conselho Superior de Disciplina do Exército Português concluiu que Barros Basto não tinha a “capacidade moral” para servir em suas fileiras.
E o que constituía como uma deficiência em moralidade? Incrivelmente, o militar “acusou” que Barros Basto tinha “realizado a operação de circuncisão de vários alunos de acordo com um preceito da religião israelita que professa” e, além do mais, “era excessivamente afetuoso com seus alunos”. Destituído de seu posto, a dispensa desonrosa quebrou Barros Basto psicologicamente, fisicamente e financeiramente. Ele também colocou um fim prematuro a seus esforços para despertar os Bnei Anussim de Portugal, muitos dos quais viram o tratamento dado a Barros Basto como um sinal de que as autoridades não tolerariam seus retornos ao judaísmo.
A situação de Barros Basto tem sido comparada ao de Alfred Dreyfus, o Oficial Maior francês que, por ser judeu, foi condenado por traição por falsas acusações em 1894 e também expulso do serviço militar. No entanto, ao contrário de Dreyfus, não houve um Émile Zola português, que denunciou publicamente a injustiça geral francesa. Mesmo após a queda da ditadura portuguesa em 1974, a família Barros Basto não foi capaz de obter um novo julgamento.
Ao longo dos anos, a Shavei Israel suscitou o apoio de um número de organizações judaicas americanas, incluindo a Conferência dos Presidentes, a União Ortodoxa e os sionistas religiosos da América. Em fevereiro de 2012, em parte como resultado de nossa longa campanha, uma comissão parlamentar aprovou por unanimidade o relatório, que reconheceu a base anti-semita da decisão de 1937 e pediu a reabilitação do capitão Basto. A aprovação final do relatório do Parlamento Português veio no final de Agosto deste mesmo ano.
Lopes, a neta de Barros Basto e hoje a vice-presidente da comunidade judaica no Porto, disse à imprensa que esta decisão “significa o fim de uma luta que tinha sido realizada por meu avô, minha avó, minha mãe e eu.” Ela acrescentou que a decisão significa que a luta de Barros Basto e seu sofrimento não foram “completamente sem sentido.”
A reintegração do capitão Barros Basto também nos dá esperança de que outros erros históricos e anti-semitas de discriminação podem algum dia ser consertadas com justiça. E, talvez mais do que tudo, ela demonstra que a advocacia e a atitude intrinsecamente judaica de “nunca desistir” pode – e deve – alcançar resultados tangíveis.
Com a conclusão do caso Basto Barros, uma mancha foi removida do nome de um homem nobre. Que sua alma finalmente possa descansar em paz!