Parasha da Semana – Shoftim

Parasha da Semana – Shoftim

Parshat Shoftim

Por: Rav Reuven Tradburks

A Parshat Shoftim é a 2ª de 3 parshiot que tem um total de 170 mitzvot.  Shoftim tem 41.  Estas 3 parshiot são a parte do meio de 3 secções de Sefer Devarim. A primeira secção, Parshiot Devarim, Vetchanan e Ekev, foram a narrativa de Moshe sobre as lições do passado.  Não sejas cético quanto à tua capacidade de entrar na terra; esse foi o pecado dos espiões, e não queres repetir o destino deles. Ele fez uma revisão das lições das histórias fundamentais da Torá: o Monte Sinai, o bezerro de ouro, os espiões, o maná e outras. A última das 3 secções de Devarim volta à preparação para entrar na terra, incluindo 4 parshiot muito curtas. Estas 3 parshiots do meio são a construção da nação: expressam a visão do tipo de sociedade que queremos construir na terra de Israel. Na semana passada assistimos à introdução do primeiro pilar da sociedade judaica:  o estabelecimento de uma sociedade monoteísta, incluindo  a centralidade do que será Jerusalém e a prevenção da  atração pelo culto idolátrico. Vimos o pilar de chesed e mitzvoth que ditam leis sobre os cuidados aos necessitados em Shemita e em Maaser Sheni: numa palavra, monoteísmo ético. Shoftim é a construção das instituições nacionais: o poder judicial, o executivo e o legislativo, incluindo tribunais, o rei, os profetas e a boa conduta de guerra. Embora tenham sido apresentadas muitas leis, está tudo num fluxo natural, delineando os aspetos cruciais de todos estes ramos do governo. Um tema que anima muitas destas instituições nacionais não é apenas o seu papel, mas também os seus limites: aquilo a que hoje chamamos os controlos mútuos e o equilíbrio entre instituições.

1a aliá (Devarim 16:18-17:13) Tribunais: Estabelece tribunais e sê vigilante na justiça; não mostrar favoritismo ou aceitar subornos, porque eles turvam o bom senso. Não plantes uma árvore ao lado do altar, nem estabeleças um monumento de pedra, nem ofereças sacrifícios com defeito.  Se se encontrar alguém a adorar ídolos, examina o caso cuidadosamente em tribunal:  a culpa deve ser identificada através da declaração de testemunhas. Se o caso for considerado verdadeiro, condena essa pessoa à morte e remove o mal do teu meio. Se uma decisão for difícil, remete-a para o tribunal superior; a decisão dele é vinculativa.  Não te desvies da decisão dele.

Judiciário:  O que se refere aqui é a importância de tribunais justos; no entanto, o que se pretende evitar é ainda mais importante. Nada de milícias. Não lutes contra as batalhas do Senhor dizendo «Aquela pessoa está a adorar ídolos! Vou lá eu mesmo eliminá-la! Quem precisa de tribunais?». Um sistema judicial é um mecanismo de equilíbrio e controlo sobre o zelo religioso. Um compromisso com a justiça requer a contenção do povo; não se pode simplesmente fazer o que se acha melhor. Relega essas questões para os sábios juízes.

2ª aliá (17:14-20) Rei: Quando te estabeleceres na terra, nomeia um rei judeu. Ele não pode acumular cavalos em excesso, nem muitas esposas, nem prata e ouro. Terá sempre a sua própria Torá com ele, a fim de evitar o autoengrandecimento e garantir a fidelidade às mitzvoth.

Poder Executivo: Há pontos fortes e fracos em todos os sistemas de governo conhecidos pelo Homem.  A fraqueza de uma monarquia ocorre quando o Rei já não serve o povo, mas sim os seus próprios interesses.  Daí o equilíbrio e os controlos: a) Limita a quantidade de cavalos, ou seja, o poder dos militares b) Limite ao número de esposas, ou seja, um limite à autoindulgência e à devassidão e 3) Limite ao ouro, à ganância de posses.  Em vez disso, lê a Torá.  O Rei servirá a De’s e ao Seu povo, e não os seus próprios interesses.

3a Aliá (18:1-5) CohenLevi: A tribo de Levi, incluindo os Cohanim, não deve ter parte na terra de Israel, porque o seu lote é o serviço sagrado. O Cohen, que serve a De’s, receberá porções de animais e de produtos agrícolas.

Estes líderes religiosos são sustentados por um tipo de imposto pago pelo povo. Mas há limites: Não têm terra. E recebem só as porções que lhes são destinadas. Mas o importante não é só o que é dado para sustentar os Cohanim e os Leviim; é também o que não é dado. Todas as sociedades sustentam os seus líderes religiosos. A chave é o controlo do abuso de posição, através da declaração do que recebem: isto, e apenas isto. Tal como o devoto tem que recuar e permitir que sejam os tribunais a lidarem com o adorador de ídolos. E tal como como o rei deve recuar e limitar o seu poder e tendência pessoal à luxúria e à riqueza. Assim, os líderes religiosos devem ter uma posição recuada e servir a De’s e ao povo; sendo sustentados, mas com moderação.

4a aliá (18:6-12) O Levi é autorizado a servir no Templo sempre que quiser. Feitiçaria: Evita as práticas dos povos da terra, tais como o sacrifício infantil, a adivinhação, os presságios, a feitiçaria, a comunicação com os mortos.  A tua lealdade é para com De’s.

Enquanto a aliá anterior nos dava um sistema de controlos e equilíbrios para controlar a riqueza dos Cohen, quando se trata de fazer o próprio serviço no Templo, o Levi é recebido sempre que o seu coração o impele.  Pois essa é a sua verdadeira tarefa.  Quando o coração se impele por corrupção e abuso de posição, precisa de travões.  Quando os corações se impelem para o serviço divino, isso é bem-vindo.

Legislatura: A menção aqui da feitiçaria e da adivinhação é uma apresentação à legislatura, o conteúdo da própria lei. A legislatura não seria muito mais fácil se soubéssemos o futuro? E, a nível mais básico: quem somos nós para sabermos quais são as leis sábias e eficientes? Se pudéssemos vislumbrar os segredos do mundo, os mistérios ocultos… Há muitos mistérios no nosso mundo. Há demonstrações de poderes incomuns, fontes inexplicáveis de conhecimento, um mundo de forças invisíveis. Se esses poderes são reais ou ilusórios pode ser debatido. Mas isso não é para ti. Mantém-te longe. A Torá exige restrições poderosas. Isso não é a nossa fonte de verdade. Tal como a próxima aliá nos diz, a nossa fonte de verdade é De’s através do profeta.

5a aliá (18:13-19:13) Profeta: Enquanto os povos da terra procuram a sabedoria através de técnicas mágicas, vós procurais a vossa através do próprio De’s. Embora tenhais dito no Sinai que não queríeis ouvir a Sua voz diretamente, tendes o Profeta para transmitir as diretivas de De’s. Prestai atenção às palavras do profeta, mas não às do falso profeta. As previsões do verdadeiro profeta realizam-se: as do falso profeta não.  Preparai 3 cidades na margem leste do Jordão e 3 cidades na Terra de Israel como refúgio para o homicida acidental.  Ele não está sujeito à pena de morte. Não deve ser derramado na terra sangue inocente.

A nossa parsha delineou o poder judicial (os juízes) e o executivo (o rei). O legislativo, o ramo que cria as leis, é mais complicado; a fonte das nossas leis é De’s, através do profeta. Mas dentro desta pequena secção há uma expressão da humildade de Moshe. Porque a tradição sustenta que os profetas, após o tempo de Moshe, não devem ser legisladores. Não introduzem novas leis. Toda a legislação está nas mãos dos líderes rabínicos. Vimos isto anteriormente: se um caso for demasiado difícil, é reencaminhado para o tribunal superior e, em seguida, fica vinculado à sua decisão. A lei, a partir de agora, está nas mãos dos rabinos, não nas mãos do profeta. Quando o Moshe diz aqui para ouvirem a voz do profeta, ele na realidade está a falar de si mesmo.  Os profetas no futuro encorajarão, repreenderão, criticarão e dirigirão o povo: mas não com novas leis. Moshe não quer  dizer  «ouçam-me a mim e só a mim».  Em vez disso, ele diz: «Sigam as leis do verdadeiro profeta», que é Moshe.

6a aliá (19:14-20:9) Não ultrapasses as fronteiras da tua propriedade.   Testemunhas: Uma testemunha é insuficiente no tribunal. Testemunhas coniventes que pretendem prejudicar alguém através do seu testemunho receberão o mal que pretendiam causar. Guerra: Não tenhais medo do inimigo na guerra, pois De’s trava as vossas batalhas. Será especialmente nomeado um Cohen para encorajar os soldados. Além disso, isentarás alguns dos soldados: aqueles que têm uma nova casa, uma nova vinha, uma esposa nova, ou que têm medo. Estes não devem desmoralizar os outros soldados.

Tendo delineado o poder judicial, o executivo e o legislativo, uma das principais funções do executivo, o Rei, é proteger militarmente o seu povo.  Algumas leis de guerra estão delineadas. A moral do exército é primordial. A presença dos Cohen lembra aos soldados que são o exército de De’s.  No entanto, a moral pode ser prejudicada por soldados apreensivos com as suas preocupações pessoais. O Midrash sustenta que uma casa nova ou uma nova vinha não são motivos suficientes para receber uma isenção do exército. Esses elementos estão lá para que aqueles que estiverem realmente com medo possam deixar o campo de batalha e não desmoralizar os outros, sob o manto de que talvez tenham uma nova vinha, poupando assim o amor-próprio do soldado assustado.

7a aliá (20:10-21:9) Na iminência de guerra, tenta a paz primeiro.  Mas se a paz for recusada, faz a guerra até ao fim, para não se dar o caso de os sobreviventes te desviarem. Não destruas árvores de fruto quando cercares uma cidade.  Quando for encontrado um corpo no campo, a cidade mais próxima realizará uma cerimónia declarando que não é responsável por esta morte.  A terra precisa de ser limpa de sangue inocente.

Depois das leis da guerra, a Torá volta a um corpo solitário encontrado morto no campo.  E a necessidade de limpar a liderança e a terra deste sangue inocente.  Isto também é uma espécie de equilíbrio e controlo sobre os militares.  Não penseis que temos pouca consideração pela vida.  A perda de vidas inocentes profana a terra e profana-nos a nós.  Faz a guerra com moderação.

Parasha da Semana – Ree

Parasha da Semana – Ree

Parashat Re’eh

Por: Rav Reuven Tradburks

A parashat Re’eh dá início a uma parte cheia de Mitzvot. Nas próximas 3 parshiots há 170 Mitzvot; 1/4 de todas as mitzvoth da Torá.  No fluxo do discurso de Moshe, ele passa de «como chegámos onde estamos» para «como vamos viver na terra».  Chega de falar do primeiro; agora estamos a falar do segundo, da criação da sociedade judaica na terra. Nas primeiras 3 parshiots de Devarim, ele reviu a nossa história e as suas lições. Se duvidarem sobre se conseguem conquistar a terra, lembrem-se do pecado dos espiões; não repitam o ceticismo deles. Se duvidarem da vossa capacidade, lembrem-se das vossas vitórias sobre Sichon e Og. Se vos preocupa que as nações possam ser demasiado poderosas para vocês, lembrem-se das maravilhas do Egito; Ele fará o que for necessário. Se duvidam do vosso valor, lembrem-se do Sinai; Ele escolheu falar convosco, o Seu povo. Mas se se acharem superiores, lembrem-se do vosso pecado do bezerro de ouro. Estas primeiras 3 parshiots abordam os pensamentos, as dúvidas e as preocupações na mente do povo; Moshe atenua essas incertezas recontando as lições da sua viagem até aqui.  Agora Moshe começa a falar sobre a sociedade que queremos construir na terra. Quais são os pilares desta nova sociedade? Quais são as suas características, os seus princípios, os seus valores? É isto que Moshe aborda agora, através da linguagem das Mitzvot. É uma sociedade centrada em De’s. A vossa lealdade a De’s será desafiada; tem que ser cuidadosamente protegida.  E tem que ser uma sociedade de generosidade.

1a aliá (Dvarim 11:26-12:10) Coloco perante vós bênçãos como consequência do cumprimento das mitzvoth, e maldições como consequência da falta de cumprimento. Estais entrando na terra e estabelecer-vos-eis lá. Estas são as leis: livrar a terra dos ídolos, quer estejam nas montanhas, nas colinas ou debaixo das árvores. E acabai com a adoração desses ídolos. Não sirvais o vosso De’s em muitos lugares; servi-O apenas no único lugar que Eu escolho. É para lá que levareis todas as vossas oferendas.  E é aí que vos regozijareis.

Aqui somos apresentados pela primeira vez à noção de um Templo; há um único lugar de serviço nacional a De’s. Ao termos apenas um lugar, reforçamos que há apenas um De’s. E somos apresentados à noção de simcha.  Ao servir a De’s neste lugar central, terás simcha. Simcha é a alegria interior, a satisfação, a euforia de estar perante De’s. A verdadeira alegria é a sensação de que as nossas vidas têm significado, que temos uma relação preciosa com De’s e Ele connosco; nada poderia ser mais significativo ou mais satisfatório.  Isso é simcha, alegria interior.

2ª aliá (12:11-28) O lugar que De’s escolher habitar será o lugar para onde trarás as tuas oferendas.  E regozijar-te-ás com a tua família, com os teus trabalhadores e o Levita. Podes consumir carne onde quer que habites, mas não como oferenda sagrada. As coisas sagradas devem ser feitas apenas neste lugar. Quando tiveres expandido as fronteiras e quiseres consumir carne, podes fazê-lo sem quaisquer restrições de tuma. No entanto, não consumas o sangue.  Não podes fazer oferendas e votos no teu local, mas apenas no lugar que Ele escolher.

A Torá está enfatizando a natureza exclusiva do Templo. E, ao mesmo tempo, está distinguindo entre o consumo de carne e o serviço divino. A carne, podes consumi-la onde quer que estejas: é algo mundano, rotineiro, não é um serviço divino. Mas a carne do serviço divino, essa é que só pode ser consumida no local central.

3a Aliá (12:29-13:19) Quando te instalares na terra, desconfia da atração das religiões da terra. Embora te sintas tentado a querer aprender como os outros povos servem os seus deuses e a imitar alguns elementos, não o faças. Nós temos a nossa maneira; não adiciones nem subtraias nada àquilo que é nosso. Se um profeta previr eventos futuros com precisão mas instruir as pessoas a seguir um deus falso, não o ouças. Tens que seguir a De’s. Se o teu irmão, filho, filha ou mesmo a tua esposa ou melhor amigo tentarem convencer-te a seguir um ídolo, não os ouças. Eles devem ser mortos por tentarem influenciar as pessoas à idolatria. Não deves protegê-los. Se uma cidade inteira adorar ídolos, deve ser destruída.

Esta aliá descreve o fascínio do culto idolátrico e, em particular, os iscos, os anzóis que atraem as pessoas. Em particular 4 anzóis: a beleza das práticas, o poder do profeta carismático, a atração pelas pessoas mais próximas de nós, e a força do grupo. As religiões do mundo não são estúpidas. Há muitas práticas nobres, muita grandeza, inspiração e beleza. Talvez te perguntes se os nossos serviços podem ser melhorados por cantores de gospel ou pela grandiosidade de um órgão de Igreja. Não vás à procura das coisas boas que os outros têm. Por 2 razões: As nossas práticas são nossas. Nós servimos a De’s como Ele mandou. E, em segundo lugar, ao olhar para as suas práticas, arriscas-te a seres atraído a mudar de lado e a ficar do lado deles.

E as pessoas influenciam as outras pessoas. O profeta, que ganhou autoridade através da previsão do futuro, tem uma grande influência. Não lhe dês ouvidos se ele professar uma crença em ídolos. O mesmo acontece com os mais próximos de nós: parentes, cônjuges, melhores amigos. Normalmente nós escutamos as pessoas em quem confiamos. Mas, se nos estiverem a atrair para ídolos, não o devemos fazer. E há também o poder do grupo – a pressão social, uma cidade inteira. É difícil virarmo-nos contra eles em julgamento.  Temos tendência a proteger os nossos líderes, a nossa família. Todos conhecemos isto: o desejo de proteger a pessoa que está no poder ou o membro da nossa família, permitindo-lhes continuar com os seus caminhos prejudiciais.

4a aliá (14:1-21) As leis da kashrut: animais com casco fendido e que ruminam podem ser comidos. Peixe com barbatanas e escamas. Aves predadoras não são kosher. E não se pode consumir um animal que morreu por si só, nem cozinhar um bezerro no leite da mãe.

As leis de Kashrut já foram dadas na parashá Shemini. São repetidas aqui talvez porque servem como barreira ao contacto social com os povos da terra. Nós vemos o Divino em cada pessoa, e isso exige que respeitemos e honremos todas as pessoas devido essa imagem divina, mas a Torá está muito preocupada com o facto de que, se nos aproximarmos demasiado dos adoradores de ídolos, seremos atraídos pelo culto idolátrico. Estar muito perto é demasiado perigoso. A comida é o fórum para a intimidade social. Assim, as nossas regras limitam severamente este contacto social, para nos proteger de deslizarmos para o culto dos ídolos.

5a aliá (14:22-29) Maaser sheni: 10% dos produtos devem ser consumidos nas proximidades da área do Templo. Se forem demasiados para transportar, troca-os por dinheiro. O dinheiro deve ser usado para alimentos no lugar sagrado, partilhados com outros. E alegrar-te-ás perante De’s.

O Maaser Sheni é uma mitzvah incomum. Teruma é uma quantia dada aos Cohanim, como um imposto para apoiar os Cohanim. O Maaser é 10% dado aos Leviim para os apoiar. Mas o Maaser sheni é 10% do resto da colheita, a ser consumido no lugar sagrado, nas proximidades da área do Templo. Em Shilo isso significava que fosse num lugar desde onde fosse possível ver a área do Templo; em Jerusalém significava dentro das muralhas da cidade. Não precisa de ser comido pelo dono, mas tem que ser comido em Jerusalén. Há 2 implicações desta Mitzvah: 1) o agricultor é forçado a passar regularmente pela experiência da santidade do mikdash, e 2) Jerusalém fica cheia de produtos. Se 10% de todos os produtos vão para Jerusalém, os preços caem devido à oferta, e os necessitados sabem que podem encontrar grande oferta de alimentos baratos em Jerusalém. Isto é uma dupla mitzvah: um empurrão para o agricultor, para se manter ligado à santidade, e uma rede de segurança para os necessitados. Jerusalém torna-se um cesto de pão, uma cidade de abundância, de excedente, e, portanto, de ajuda aos necessitados.

6a aliá (15:1-18) Shmita para empréstimos: o 7º ano cancela todos os empréstimos.  De’s vai abençoar-vos na terra para que não haja pobres. Quando alguém necessitado se aproximar de ti, abre a mão e dá-lhe o que ele necessita. Não recuses um empréstimo quando o ano de shemita se aproxima, por saberes que será cancelado. Em vez disso, dá, pois haverá sempre pessoas necessitadas.  Um escravo também será libertado no 7º ano. Faz-lhe donativos generosos após a sua libertação. Se ele quiser continuar teu escravo, pode fazê-lo. Não te ressintas por enviá-lo em liberdade, pois trabalhou para ti durante 6 anos; De’s vai abençoar-te por cumprires este mandamento.

Esta aliá e a anterior formam o segundo pilar da sociedade na terra: cuidar dos outros.  O primeiro pilar foi uma sociedade centrada em De’s; o monoteísmo, expresso por um templo central para onde são levadas todas as oferendas. Cuidar dos outros é o próximo pilar. O cancelamento de empréstimos a cada 7 anos é uma forma de insolvência, que permite um novo começo para quem caiu em tempos difíceis. A Torá diz que não haverá pobres. Mas depois, no final da aliá, diz que sempre haverá pobres. O que significa é que sempre haverá pessoas necessitadas. Mas quando De’s vos abençoa com abundância, não há razão para essas pessoas continuarem a ser necessitadas; o agricultor vai partilhar a sua abundância. Quando fores abençoado, partilha a bênção com aqueles que precisam. Haverá pessoas que precisam; o teu trabalho é garantir que não permaneçam assim.

7a aliá (15:19-16:17) Deve ser trazido como oferenda um animal primogénito. Se tiver algum defeito, é consumido pelo proprietário. Pesach: a oferenda de Pesach deve ser trazida para o lugar que Ele escolher. Shavuot: Tu e todos os teus regozijar-vos-eis no lugar que Ele escolher. Sucot: Celebrarás durante 7 dias na época da colheita e estarás alegre. Nestes dias festivos, apresentamo-nos diante de De’s e celebramos com o que fomos abençoados.

As festas de 3 regalim, ou de peregrinação, são uma forma de engenharia social religiosa. O judeu precisa de passar tempo em Jerusalém regularmente. Esta experiência faz a diferença. Todos sabemos isso. Sair da nossa rotina e passar pela experiência de estar num lugar mais raro e sagrado vai deixar a sua marca. Estamos sempre perante De’s, mas a viagem regular a Jerusalém cria uma ligação regular com a santidade. Nós vemos isso nosso tempo. Oh, como somos privilegiados em podermos ver o impacto da riqueza da nossa moderna Jerusalém nos judeus do   mundo. A quantos de nós o despertar da centelha religiosa não ocorreu nas ruas de Jerusalém? As festas de peregrinação são engenharia social: a experiência da santidade do Mikdash impacta positivamente a santidade do povo.

Parasha da Semana – Ekev

Parasha da Semana – Ekev

Por: Rav Reuven Tradburks

O longo discurso de Moshe é uma verdadeira obra prima de liderança religiosa. Moshe está a  preparar o povo para entrar na terra, mas está nervoso com várias possíveis falhas. E trata dessas preocupações uma por uma. A primeira é a negligência das mitzvot e a idolatria – o centro da vida judaica. Na semana passada, em Vaetchanan, a palavra Shema, nas suas várias formas, apareceu 19 vezes.

A nossa parashá lida com desafios inevitáveis ao entrar na terra: medo, riqueza e sucesso. Uma perspetiva adequada para compreender quem és tu e Quem É De’s, o que é habilidade tua e o que é Ajuda dEle, permitir-te-á lidar com estes desafios. E Moshe usa as experiências fundacionais no deserto para ensinar essa perspetiva adequada.

A segunda parte da parashá passa ao tratado de Moshe sobre a vida interior. A vida de amor, de aspirações, de paixão. A necessidade de ter lei e espírito já é antiga; Moshe revela os seus sentimentos mais íntimos sobre a vida do espírito.

1a aliá (Devarim 7:12-8:10) «Nos calcanhares» de manteres as mitzvoth, De’s manterá o Seu pacto contigo.  E amar-te-á.  Terás sucesso: económico, de saúde, militar. Se temerdes as nações da terra, imaginando como podereis prevalecer sobre elas, lembrai-vos do que De’s fez no Egito.  Os sinais, as maravilhas, o braço estendido.  Também o fará a estas nações. Quando entrardes na terra, recordai o maná no deserto. De’s aliviou a vossa fome através do maná, para vos ensinar que o pão vem dEle. Agora, quando entrardes na terra, será diferente: riachos e nascentes, trigo, cevada, uvas, figos, romãs, azeite e tâmaras.  Comereis e ficareis satisfeitos e abençoareis a De’s por todas estas dádivas.

Talvez estejam preocupados com falhar, derrotados pelas nações. Moshe utiliza a História: lembre-se do Egito. Eles eram mais poderosos, até que a intervenção de De’s com pragas e maravilhas. Não tenham medo.

A riqueza da terra é uma preocupação. A comida nasce das árvores e das plantas, trigo e cevada silvestre. Quem precisa dEle? Lembrem-se do maná e de Quem fornece. Esse maná foi uma lição, de que Ele é Quem fornece o alimento. Na terra, vai parecer completamente diferente, com os alimentos a brotarem da terra e das árvores. Mas não permitam que essa riqueza vos afaste de De’s. Ainda é Ele quem fornece o alimento. Nós, esta geração de riquezas fabulosas, sabemos muito bem como o sucesso dos judeus modernos não deixa espaço para o Divino.

2ª aliá (8:11-9:3) Fica atento, no meio de todo o teu sucesso, para não te esqueceres de onde ele vem. Mesmo depois de Ele te ter liderado todos estes anos, pode acontecer que digas «todo este sucesso é fruto do meu trabalho».  Lembra-te: é Ele que te dá este sucesso, como expressão do brit que fez contigo. Se O esqueceres, Ele esmagar-te-á. Como vences as nações da terra, o mesmo te acontecerá a ti, «nos calcanhares» de O ignorares. Grandes nações esperam por ti; cidades fortificadas, pessoas fortes.  Fica a saber que Ele defenderá a tua causa e eles serão vencidos por ti.

Assim como o sucesso material retira De’s das nossas vidas, o mesmo acontece com o sucesso nacional na construção da nação judaica e nas vitórias sobre os povos da terra. Da mesma maneira que o alimento a crescer naturalmente nas árvores pode levar-nos a tirar De’s da «fotografia», o sucesso nacional, a capacidade militar e o sucesso económico nacional podem levar-nos também a esquece-Lo. Eu sou o arquiteto do meu próprio sucesso. Nós somos simplesmente mais fortes, mais inteligentes e mais capazes do que as outras nações.

3a Aliá (9:4-29) Não penseis que o facto de expulsardes as nações se deve à vossa retidão e à maldade delas. Deve-se ao fracasso delas e ao pacto de De’s convosco.  Lembrai-vos: tendes uma longa história da vossa própria maldade. Em Horeb: Eu subi à montanha para obter as tábuas, escritas por De’s com tudo o que Ele disse no Sinai, durante 40 dias. Mas ordenou-me que descesse, pois tínheis feito um ídolo.  Com as tábuas na mão, desci, despedaçando-as ao ver o  bezerro de ouro.  Subi de novo para implorar por vós. E houve outros momentos de maldade. Mas supliquei, apelando ao pacto, pois sois o Seu povo.

Sentir-se superior às nações é mera soberba. Lembra-te do bezerro de ouro, do teu terrível momento de loucura.  Moshe está preocupado com as maquinações da mente, com as nossas memórias curtas, com as ilusões.  Lembra-te da nossa história, diz ele. Aprende com ela. É Ele quem defende a nossa causa. É Ele a fonte do nosso sucesso. E não deixes que esse sucesso te suba à cabeça. Sofres de fraquezas, como todos os outros. Erros graves.  Mas, como veremos na próxima aliá, Ele não desiste de ti. E isso diz mais sobre a Sua grandeza do que sobre a tua.

4a aliá (10:1-11) De’s disse-me: grava duas tábuas de pedra para substituíres as primeiras e faz um Aron para elas. Foi feito um segundo conjunto como o primeiro, e colocado no Aron. Desci com o Aron. Os Leviim serão servos de De’s; eles levam este Aron. Implorei, e consegui que não fosseis destruídos. De’s disse: subi e conquistai a terra que prometi aos vossos antepassados.

Esta é a conclusão da história do bezerro de ouro. Moshe está a dizer ao povo para se lembrarem desta história, para moderarem os seus sentimentos de superioridade.  Não te sintas superior. O bezerro de ouro foi uma grande falha. No entanto, nesta conclusão, ele sublinha um ponto diferente: a reconciliação.  Como se dissesse: Não sois uma nação perfeita. Falhastes, e no futuro também falhareis. Mas não desesperes. O compromisso de De’s contigo é mais poderoso do que as tuas falhas.

Ao tratar destas três preocupações, o medo, as riquezas e o sucesso nacional, Moshe tem tratado de uma preocupação mais global: Como deveremos olhar para os nossos sucessos e falhas como barómetros do favor de De’s? Quando tudo corre bem, não quer isso dizer que Ele está contente connosco? Não, diz Moshe. De’s é generoso, Ele perdoa. Os Seus caminhos enganam; tu podes comportar-te mal, mas Ele é magnânimo.

5a aliá (10:12-11:9) Agora, o que quer De’s realmente de ti? Só isto: que O temas, que andes pelos Seus caminhos, que O ames, que O sirvas e que guardes todos os Seus mandamentos. O universo inteiro é dEle, mas Ele escolheu amar os teus antepassados. Circuncida o teu coração e para de endurecer o pescoço. Teme-O, serve-O, cede perante Ele. Ele é o teu De’s. Como vistes: Descestes ao Egito com 70 almas, todas as maravilhas que Ele fez, a derrota do poder do Egito no mar, o deserto, a terra engolindo os rebeldes na rebelião de Korah. Vistes tudo isto, portanto, guardai as mitzvoth para prolongar a vossa estadia na terra.

Estes 20 versículos são muito difíceis de resumir, pois são tão deslumbrantemente belos. Este é Moshe num momento de intimidade.  É como se ele se inclinasse um pouco mais para perto de nós, pusesse os cotovelos na mesa, e confidenciasse: escute, a sério, o que é que De’s quer? Poderíamos pensar numa resposta de uma palavra, ou de uma de frase, tipo: Lealdade. Ou: Que caminhemos humildemente com Ele. Ou: Verdade.  A resposta de Moshe não é o que fazer, mas como o fazer. Moshe responde: Sabe o que De’s quer? De’s quer emoção, aspiração, sentimentos, sensibilidade. De’s quer que o seu ser mais profundo O queira, O ame, se una a Ele.  Largue as inibições, as distrações, e a superficialidade da vida e dê-Lhe o seu mais profundo «eu». Que frase: circuncida o teu coração, pára de endurecer o pescoço. Ou seja, dá-me o teu verdadeiro coração, não sejas teimoso. Esta aliá classifica-se lá em cima, é das mais poderosas da Torá. Porque Moshe nos capta com uma pergunta simples: Afinal, o que quer De’s? E, na sua resposta, partilha connosco os seus sentimentos mais profundos, uma resposta muito profunda: Ele quer que O queiras, que O ames, que te preocupes com Ele. Entrega-te completamente.

6a aliá (11:10-21) A terra de Israel não é como o Egito: o Egito é fértil, com uma abundância de água. Israel depende da chuva dos céus; por isso De’s olha sobre a terra durante todo o ano. (2º parágrafo do Shema). E se guardares as Mitzvot e amares a De’s com todo o teu coração, então haverá chuva.  Se te afastares disto e servires outros deuses, então não haverá chuva, nem as colheitas crescerão. Fica sempre ciente disto, falando disso com os teus filhos e em tudo o que fizeres. Este amor de De’s vai prolongar o teu sucesso na terra.

Esta é uma nova reviravolta no tema do amar a De’s. Não só o teu sucesso militar dependerá do teu amor por De’s, mas também a chuva. E vais precisar de chuva. Não como no Egito. É quase como se De’s estivesse a dizer: Vou levar-te para a terra prometida por causa do meu amor por ti. Mas é uma terra que exigirá que derrotes as nações para a ocupar.  E é uma terra que requer que Eu lhe dê a chuva. E o sucesso destas duas coisas, o sucesso militar e a chuva, exigem que Me ames.  Resumindo: Eu amo-te e levo-te para uma terra onde terás de Me amar.

7a aliá (11:22-25) Se cumprires as Mitzvot, amares De’s e te unires a Ele, então prevalecerás sobre as poderosas nações da terra. De’s vai fazer com que te temam e ninguém será capaz de te enfrentar.

Amor, coração. A palavra amor aparece 6 vezes, a palavra coração 4 vezes nestas últimas aliot. Moshe mudou: do fazer ao sentir, da lei ao espírito. Fazer não é suficiente. Ama, entrega o coração. Entrega tudo no teu amor por De’s.

Parashá da Semana – Ve’etchanán

Parashá da Semana – Ve’etchanán

Por: Reuven Tradburks

1a aliá (3:23-4:4) Supliquei a De’s que me permitisse entrar na terra. Ele recusou: Sobe a montanha e olha para a terra onde não entrarás. Encarrega Yehoshua; ele liderará o povo.  Agora, Ysrael, Shema, ouve os mandamentos para que permaneças na terra.  Viste o que aconteceu com Baal Peor: aqueles que seguiam Baal Peor foram punidos, enquanto aqueles que não o fizeram, sobreviveram.

Nesta aliá, o discurso de Moshe faz uma viragem.  Em Parshat Devarim falou da marcha para a terra: o parênteses de 40 anos por causa dos espiões, a retoma da marcha e as vitórias sobre Sichon e Og.  O tema foi a marcha para a terra. Esta primeira parte desta aliá devia estar na parashá da semana passada.  Eu também queria entrar na terra, mas De’s recusou, permitindo-me apenas um vislumbre. Começa o tema seguinte no discurso de Moshe: a vida na terra.  Talvez a recusa de De’s em permitir que Moshe entrasse na terra seja o preâmbulo perfeito para falar sobre a vida na terra.  Saibam isto: viver na terra é um dom, um dom divino. Ele dá.  E Ele tira. Este presente não é um direito adquirido. Eu sei isso por experiência própria.  Vivam de maneira que o mereçam.

2ª aliá (4:5-40) Guardai as mitzvoth, pois são sábias.  As nações olharão para as mitzvoth e dirão: Que povo sábio.  E quem tem um De’s tão próximo quanto o nosso o é de nós?  Ou quem tem leis tão nobres como as da nossa Torá?  Lembrai-vos do dia no Sinai, a montanha em chamas e a escuridão da nuvem.  Ouviu-se A Voz, mas não havia nenhuma forma.  Não façais imagens.  Ensinei-vos as mitzvoth; guardai-as, pois são o pacto com De’s.  Os vossos filhos farão imagens e serão exilados, atirados para os confins da terra, servindo ídolos nesses lugares. Eles regressarão a De’s, procurando-O com todo o coração.  Ele não esquecerá o Seu pacto.  Porventura há outro povo que tenha ouvido a voz de De’s no meio do fogo?  Ou mais Alguém que tenha tirado o Seu povo, com sinais e maravilhas, de entre outro povo?  Sabei e gravai nos vossos corações que não há nenhum deus além de De’s.

Moshe enfatiza 2 coisas únicas das quais nós usufruímos: o nosso De’s e a nossa Torá. Há outras nações que reconhecem isto.  A mensagem implícita aqui é: porquê ir correndo para outros deuses e outras religiões, quando a nossa é tão profunda que as outras nações a reconhecem? Se eles veem a nossa religião como profunda, nós também devíamos vê-la assim.

3a Aliá (4:41-49) Moshe separou 3 cidades de refúgio para aqueles que matarem uma pessoa acidentalmente no lado leste da Jordânia. Moshe ensinou estas leis no lado leste do Jordão, nas terras já conquistadas.  Estas terras conquistadas estendem-se  desde o Mar Morto até ao Monte Hermon.

O facto de Moshe escolher 3 cidades de refúgio no lado leste do Jordão é a sua confirmação do direito de Bnei Gad, Bnei Reuven e metade de Menashe de habitarem lá.  Rav Yoel Bin Nun defende que esta vasta área sobre o Jordão torna-se parte da terra prometida. Moshe recebeu ordens na 1ª aliá para subir a montanha e olhar para oeste, norte, sul e leste. Bem, olhar para leste seria olhar para fora da terra de Israel.  Porquê olhar para aí?  Assim, Rav Yoel sustenta que a derrota de Sichon e Og foi o início da conquista da terra, e que essas terras se tornaram parte de Eretz Yisrael.   Moshe olha para leste porque aquela terra também faz parte de Eretz Yisrael.  Então Moshe participa sim, pelo menos no início, da conquista da terra de Israel.

4a aliá (5:1-18) Monte Sinai. Moshe chamou o povo: Shema, Yisrael, os mandamentos, porque o nosso De’s fez um pacto no Sinai.  Ele fê-lo convosco, cara a cara, no meio do fogo.  Eu transmiti a mensagem porque tivestes medo.  E Ele disse: «Sou o De’s que te tirou do Egito.» Não façais imagens.  Nem useis o Meu nome em vão.  Guardai o Shabbat como um dia de descanso para lembrar que fostes escravos no Egito.  Honra o teu pai e a tua mãe.  Não assassineis, não cometais adultério, não roubeis, não testemunheis falsamente, não cobiceis.

Moshe descreve a entrega da Torá no Sinai. Ao fazê-lo, sublinha o brit, o pacto.  É este pacto que anima todo o resto do livro.  Há dois pactos: o brit feito com Avraham para entregar a terra, e o brit feito no Sinai, que são as mitzvoth que devemos guardar. O primeiro brit, dar-nos a terra, veio sem nenhuma expectativa em particular.  Mas o segundo brit não é assim. E é isso que Moshe está agora a enfatizar.  Não parem no Brit 1; ele está ligado ao Brit 2.  A entrega da terra está ligada às mitzvoth.  Não é que esteja dependente delas. Bereshit dá-nos a entender que a promessa da terra é sem expectativas.  Mas o sucesso na terra está ligado ao Brit 2, as mitzvoth.  A promessa da terra nunca diminui; mas o sucesso na terra pode diminuir.  Moshe introduz este tema aqui, no início do seu longo discurso ao povo; e é este tema que vai ecoar ao longo de todo o resto do seu discurso.

5a aliá (5:19-6:3) Quando ouvistes estas palavras no meio do fogo e da nuvem, ficastes com medo.  Abordastes-me e dissestes: Agora sabemos que o Homem pode ouvir a voz de De’s, mas temos medo de morrer. Moshe, vai tu ouvi-Lo, não nós.  De’s concordou e disse-me: Tu ficas Comigo e Eu digo-te todos os mandamentos para guardares na terra.

A palavra Shema aparece 8 vezes nos primeiros 7 versículos desta aliá. As pessoas ouviram A Voz no Sinai, mas tinham medo.  Então, Moshe, ouve-O por nós.  E De’s ouviu a sugestão deles e disse que era boa. Está bem, Moshe vai ouvir a voz de De’s. Mas o problema não é quem vai ouvir.  A questão é quem vai escutar. Quer dizer: quem vai ouvir a voz com o seu ouvido, isso pode ser Moshe, não há problema.  Mas quem escuta, quer dizer, quem ouve, entende, compreende e aceita, isso têm que ser todos.  Daí o último versículo da aliá, 8 versículos depois, voltar ao Shema: Shemata Yisrael, ouviste Israel e, portanto, guarda as mitzvoth.  Há audição e audição…  Moshe é o vosso aparelho auditivo para ouvir; mas são vocês que precisam de escutar.

6a aliá (6:4-25) O Shema.  Shema Yisrael, De’s é Um. Amarás a De’s, e terás isso no teu coração constantemente; ensinando-o aos teus filhos, falando disso em todos os momentos e em todos os lugares. Amarra-te com amor a De’s; deixa que esse amor te guie, a ti e à tua casa.  Quando entrardes na terra, encontrareis coisas que não construístes: grandes e boas cidades, casas cheias de coisas maravilhosas, cisternas, vinhas, olivais.  Mas tende cuidado para não esquecer De’s. Temei-O, servi-O. Fazei o que é moral e bom aos Seus olhos e Ele far-vos-á bem. Quando os vossos filhos vos perguntarem sobre todos estes mandamentos, dizei-lhes: Éramos escravos no Egito, e De’s tirou-nos de lá e deu-nos esta terra.  Estes mandamentos são para cultivar em nós o respeito e o temor por Ele e trazer-nos mérito para nos preservarmos nesta terra.

Amamos a primeira linha do Shema, mas a ênfase do parágrafo está na segunda. Amor de De’s. Todo o teu coração, toda a tua alma, toda a tua força.  Estamos tão habituados a dizer esta frase que já nem reparamos no seu poder. Moshe está a falar com o povo: Entreguem-se completamente a isto. Deixem-se ir. Ponham todas as vossas forças nisto.  Sem inibições. O amor de De’s deverá estar presente em toda a tua vida: a borbulhar até se alastrar os teus filhos, percorrendo-te nas tuas viagens, nas tuas ações, nos teus pensamentos, em tua casa. Não admira que este parágrafo seja o coração da nossa tefila diária.  Temos de ser obcecados por De’s. Moshe, aqui, é claro como a água: Ama De’s com todo o teu coração, alma e força. Com tudo.

7a aliá (7:1-11) Quando entrardes na terra, conquistai as sete nações.  Não façais nenhum pacto com eles.  Não vos caseis com eles, pois isso levará à adoração de ídolos.  Vós sois o povo santo de De’s. Não porque sejais numerosos, mas porque Ele vos ama e fez um pacto convosco.  Sabei: Ele guarda o Seu pacto. Vós também, guardai as mitzvoth.

O amor de De’s é exclusivo. A idolatria viola esse amor. Atenção, pois o caminho para essa infidelidade são as pessoas. Fazer acordos com os idólatras da terra suaviza o caminho para os seus deuses. E, certamente, casar com pessoas da terra acelera o caminho para os seus deuses. É a atração da pertença. Você casa com uma mulher, junta-se ao grupo da fé dela, junta-se às amizades, à camaradagem; esse sentimento de pertença que uma comunidade religiosa traz. Todas as comunidades religiosas têm muitos elementos maravilhosos e que podem dar muita satisfação, mas isso é uma completa violação da nossa única relação com De’s. (paralelamente à loucura que é acreditar nesses deuses). Não é o inteleto que te atrai; é a comunidade que vem com a mulher. Casar com não-judeus é o início do processo de idolatria. Por isso, evita os casamentos mistos.

Parasha da Semana – Devarim

Parasha da Semana – Devarim

Parasha Devarim

Por: Rav Reuven Tradburks

O livro de Devarim é o discurso de Moshe na última semana da sua vida.  Um discurso bastante longo, a melhor parte de 28 capítulos.  Tem muito a dizer. Ele não entrará na terra de Israel.  O povo judeu sim.  Transferiu a liderança com sucesso: o sucessor de Aharon é Elazar, o sucessor de Moshe é Joshua.  Já vimos antes outras palavras de despedida:  Yaakov, em Parshat Vayechi, exorta os filhos.  Mas não durante 28 capítulos.  Yaakov fê-lo num capítulo de 33 versículos.  O nome em português para este livro é Deuteronómio; o Midrash chama-lhe Mishneh Torah.  Ambos significam «2» – a segunda versão da Torá, ou a repetição da Torá.  Mas estes nomes são enganadores.  Moshe não revê  toda a Torá.  Ele relata apenas algumas histórias, revendo com o povo alguns dos episódios que aconteceram anteriormente na Torá.  Mas deixa de fora muito mais do que o que repete.  Não menciona nada do livro de Bereshit.  Nem qualquer história do Egito; nada sobre a escravatura.  Ou sobre as pragas.  Ou sobre a divisão do Mar. Ou sobre as instruções para o Mishkan.  Ou sobre a maior parte do livro de Vayikra relativamente à Tuma, Tahara e às Oferendas. Portanto, não é uma revisão da Torá; é uma revisão de algumaspartes, de histórias e leis selecionadas da Torá.  Somos obrigados a perguntar porque escolheu Moshe estas histórias que encontramos aqui, e não outras. E a ordem não é de todo a de como ocorreram; Moshe muda a ordem. Onde quer ele chegar?  O que o motiva?  E, como último ponto de introdução: a linguagem de Devarim é diferente.  É emocional.  Há muita preocupação, apreensão, medo.  Preocupação com o fracasso, desafios que não serão cumpridos, nos quais o povo fracassará.  Há amor:  amor de De’s por nós e amor nosso por Ele.  Muito zelo e paixão; muitas figuras de estilo enfáticas.  Moshe, neste discurso de partida, está a partilhar muito de si mesmo, de uma forma muito reveladora, com o povo de quem se separará muito em breve.

1a aliá (Devarim 1:1-10) Moshe narrou os eventos da viagem, a viagem de 11 dias de Chorev a Kadesh Barnea.   No 1º de Adar, no ano 40, Moshe relatou ao povo tudo o que De’s lhe tinha instruído sobre eles.  Isto foi depois das derrotas de Sichon e Og, nas margens do Jordão.  Ele relatou: De’s instruiu-nos a deixar o Sinai e a tomar a terra de Israel, a terra prometida aos nossos antepassados.  E eu disse: este povo é agora tão numeroso que não posso suportá-lo sozinho.

Demorou 40 anos para fazer uma viagem de 11 dias.  Isso não é uma quilometragem lá muito boa. Moshe começa as suas palavras de despedida com uma descrição da viagem à terra de Israel. Não com a história do Êxodo.  Nem mesmo com a história da entrega da Torá.  A sua ênfase  é a viagem à terra.  O povo está prestes a entrar na terra; estão preocupados com isso.  Moshe vai ao encontro deles onde eles estão, abordando as suas preocupações imediatas.   Ele já vai chegar à parte sobre os sinais, sobre a crença religiosa e sobre os desafios religiosos.  Mas primeiro vamos tratar do assunto em questão:  entrar na terra.

2ª aliá (1:11-21) Naquela época eu disse: vamos escolher pessoas sábias para liderar o povo. Concordaram que era boa ideia. Líderes sábios foram nomeados sobre milhares, centenas, e dezenas, e também foram nomeados oficiais de aplicação da lei. Encarreguei os juízes dizendo: Ouvi e governai de forma justa, sem preconceitos.  Dei-vos instruções sobre todas as coisas que deveis fazer.  Viajámos pelo deserto até ao Monte dos Emori, Kadesh Barnea.  Chegados lá disse:  Vamos sem medo e conquistemos a terra.

É curioso que a primeira história que Moshe sente necessidade de contar seja a nomeação dos vários juízes dos tribunais, do superior e do de primeira instância.  Afinal, isto não parece ter nada a ver com a marcha para a terra.  Na verdade, há outras histórias que ocorrem como parte da marcha, como as queixas por água, que são simplesmente ignoradas. Porquê mencionar a nomeação de juízes?  Talvez Moshe esteja a abordar a preocupação calada do povo: Como é que vamos conseguir ter sucesso sem a liderança de Moshe?  Não venceremos nas batalhas sem ele. A subtileza de Moshe equilibra a sua condição de indispensável.  Não posso fazer tudo.  Não conseguia fazer tudo naquela época. Precisei de ajuda desde o início.  E agora também.  Eu sou dispensável.

3a Aliá (1:22-38) Vieram a mim para eu enviar espiões para explorar a terra.  Achei uma boa ideia escolher os líderes das tribos para essa tarefa.  Eles viajaram até lá e voltaram com frutos da terra exclamando: A terra que De’s nos dá é boa. Mas recusastes-vos a ir e revoltastes-vos contra De’s dizendo: Estes homens prejudicaram a nossa determinação, falando-nos dos gigantes e das cidades fortificadas.  Insisti que De’s travaria a batalha, como fez até agora.  Mas não confiastes em De’s, que vos tem guiado com nuvens e fogo.  Foi-vos dito que todos os que não acreditaram que podiam entrar na terra, não entrariam na terra.  E a mim também me foi dito que não entraria; Yeshoshua vai liderar o povo para entrar na terra.

Moshe está a criar uma ligação com o povo: Pedi-vos juízes e achastes que a minha ideia era boa.  Pedistes-me espiões e achei a vossa ideia boa.  As diferenças na forma como Moshe relata esta famosa história dos espiões e a forma como a própria Torá a descreveu é um tema rico para análise.  Uma das inúmeras diferenças é o papel dos espiões nesta narrativa: está em falta.  Pouco se diz sobre os espiões.  Em Bamidbar, parece que o relatório desfavorável deles despoletou uma cascata de medo.  Aqui, Moshe coloca a culpa no povo: causada pelo relatório dos espiões, mas claramente centrada no povo.  Talvez Moshe esteja deliberadamente a mudar a ênfase dos líderes para os seguidores.  Precisam de bons líderes, mas também precisam de ser bons seguidores.  A culpa de todos os fracassos nacionais não pode ser atribuída sempre aos líderes.  As pessoas também têm de assumir plena responsabilidade pelas suas decisões.  E aqui, a decisão do povo foi revoltar-se contra De’s.

4a aliá (1:39-2:1) Ao saber que não entraríeis na terra, arrependestes-vos do vosso pecado.  Deixa-nos ir para a terra.  Mas fostes avisados de que De’s não estaria convosco nisto, e os Emori afugentaram-vos como abelhas até à região de Seir.  Habitámos em Kadesh e Har Seir por muito tempo.

Quando seguimos o plano divino, temos sucesso. Quando nos aventuramos sozinhos, sem apoio divino, somos enxotados como abelhas. O nosso êxito na conquista da terra deve-se ao nosso parceiro divino.

5a aliá (2:2-30) Chegou a hora de viajar para o norte.  Não confronteis os descendentes do vosso irmão Esav que residem em Seir.  Contornai a sua terra; pagai pela comida e pela água que precisardes deles.  Além disso, não confronteis Moav, porque é a herança legítima dos descendentes de Lot.  Passando a terra de Moav, é Amon; não confronteis Amon, pois também é a herança legítima dos descendentes de Lot.  A região a norte do Arnon é a terra de Sichon e Og; estas terras são as que vos dei.   Propus a Sichon passar pela sua terra, mas ele recusou; De’s o tornou teimoso para que pudéssemos conquistar a sua terra.

Esta descrição das nossas ligações familiares é surpreendente. Não entrem em guerra com os descendentes de Esav, nem com os de Lot. São nossos parentes. E devemos ter consideração por esses parentes.  O irmão de Yaakov, Esav, instalou-se em Seir.  Ele merece respeito fraterno e, portanto, deixai-o em paz.  Moav e Amon são nações de Lot, sobrinho de Avraham.  Deixai-os em paz também; São vossos parentes.  Os irmãos, mesmo quando seguem caminhos completamente diferentes, continuam a ser irmãos.

6ª aliá (2:31-3:14) De’s disse-nos para tomarmos as terras de Sichon na guerra.  As terras foram conquistadas até ao Gilad.  Og confrontou-nos na região em direção ao Bashan e também foi conquistado.  As suas terras foram dadas a Reuven, Gad e à metade da tribo de Menashe.

Estes confrontos com Sichon e Og são as últimas histórias do livro de Bamidbar, não há muito tempo.  Moshe relata estas histórias logo no início do seu longo discurso, embora, se estivesse a rever a nossa história cronologicamente, tivesse de esperar 25 capítulos.  Fá-lo para começar o seu discurso com histórias de sucesso e encorajamento.  Ele vai querer avisar as pessoas, admoestá-las, contar-lhes sobre os seus futuros fracassos, mas isso pode esperar.  Começa com sentimentos positivos.

7a aliá (3:15-22) As terras a leste do Jordão, incluindo o Gilad e as terras desde o Kineret até ao Mar Morto foram habitadas por Reuven, Gad e metade da tribo de Menashe.  Instruí estas tribos a juntarem-se à batalha pela terra de Israel e regressarem depois às suas terras.

Este é um pedaço de terra muito grande:  a parte do lado leste do Jordão, do Mar Morto até lá acima ao Hermon, foi conquistada e será habitada pelo povo judeu.   Estas primeiras vitórias e a repetição de Moshe das suas histórias permite-lhe iniciar as suas longas instruções ao povo de uma forma positiva e  otimista. E ele descreveu como chegámos às fronteiras da terra. Agora vai focar-se em instruções muito mais importantes: como viver na terra.